11 novembro 2008

Tomás Pereira na China


Quem tivesse o privilégio de entrar na Cidade Proibida entre 1673 e 1708 poderia ver Tomás Pereira a confundir-se, nos trajes e na língua, com um chinês. Ele e outros padres jesuítas.
Tomás Pereira (1645-1708) era dos poucos, dos muito poucos, que tinha o privilégio de se aproximar de Kangxi, um dos imperadores mais populares da história chinesa. E porquê? Por causa da música.
A música tinha um papel fundamental na comunicação entre os missionários e as autoridades chinesas. Pereira acabou por escrever o primeiro tratado em chinês sobre música europeia, e ensinava a arte aos filhos do imperador.

E foi com a música que captou a atenção de Kangxi, a quem ensinou também álgebra e aritmética.

O mesmo homem que ensinava matemática ao imperador, construía relógios, redigia tratados sobre budismo, concebia um órgão de proporções descomunais que mandou instalar numa igreja de Pequim, e um carrilhão que, dizia o padre Ferdinand Verbiest (então Administrador do Calendário), atraía as atenções dos populares "que ficavam sobretudo admirados com o prelúdio musical que precedia o bater das horas".

Atraía certamente mais multidões do que qualquer calendário rigoroso ou tratado de geometria, chegando a camadas da população que não eram instruídas para entender as capacidades científicas dos jesuítas.

O padre Tomás Pereira viveu mais de três décadas (1673-1708) perto do imperador, e só a morte os separou. Nunca fez evangelização. Não era um homem do terreno. Concentrava-se a fazer pressão junto de mandarins que depois interviriam a favor dos jesuítas junto do imperador. Sabia a que portas bater para discutir pequenas coisas, pequenos gestos que constroem uma relação pessoal com o imperador, que era difícil de conseguir para um chinês, quanto mais para um ocidental.

O imperador Kangxi é uma figura referencial, um dos melhores imperadores do ponto de vista militar, de carácter. Unificou a China, abriu ao exterior, inovou administrativamente, anulou inimigos externos. Quando se procura o que há de glorioso na China, o seu reinado é extremamente importante. E Tomás Pereira é fundamental para compreender o imperador. Acompanhou-o algumas vezes em expedições. E teve um papel importante no tratado sino-russo de Nerchinsk, de delineamento de fronteiras.

Estima-se que o imperador tenha agradecido a Pereira o seu papel no tratado de Nerchinsk assinando o "Édito da Tolerância", em 1692.
Tomás Pereira morreu na China. Há 300 anos.

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