um prémio para quem adivinhar. Era médico. Nasceu e morreu no século XIX (1839 - 1871). Viveu quase sempre na cidade do Porto. Chamava-se Joaquim Guilherme Gomes Coelho e usava um pseudónimo literário que era...
O poema foi trancrito de uma edição de 1909 que segue a de 1874 e que lhe acrescenta poemas publicados noutros livros.
Uma Consulta
– Dá licença? – Entre quem é.
– Muitos bons dias. – Olé,
Por aqui, minha senhora?
Desculpe Vossa Excelência
Se a não conhecia agora.
– Sem mais… À sua ciência
Recorrer venho. – Deveras?
(Senhor me dê paciência!
Nunca tu cá me vieras).
Então que temos? – Padeço.
– Sim? porém de que doença?
– Essa é boa! acaso pensa
Que eu porventura a conheço?
– Ah! não conhece? – Quem dera!
Então não o consultava.
– (E eu que muito estimava).
Mas diga, então? – Eu lhe conto…
Oiça bem. Não perca um ponto.
– Nem um ponto hei-de perder.
– Ai, doutor, doutor, meu peito…
– É do peito que padece?
Quem havia de o dizer!
– E Jesus, doutor, parece
Que me quer interromper?!
Não era a isso sujeito.
– Nem o tornarei a ser…
Vamos lá. – Ora eu começo…
Atenção é o que lhe peço;
Diga-me: que lhe pareço?
Não me acha muito abatida?
– Assim, assim; mas às vezes
A vista pode enganar.
– Não, não. Pode acreditar
Que há já um bom par de meses
É um tormento esta vida.
– Então que é o que sente?
–O que sinto? Ora eu lhe digo:
O doutor é meu amigo?
– Oh! senhora… – E é prudente?
Oiça, pois: Eu dantes era
Fera e rija, que era um gosto!
Ou em Dezembro ou Agosto
Correr o mundo pudera,
Sem no fim me achar cansada.
– E hoje? – Não lhe digo nada,
Nem comigo posso já.
– Mau é! – Quer saber, doutor?
Só para vir até cá,
Que tormentos não passei!
– Diga-me, se faz favor.
Que idade tem? – Eu nem sei…
Eu sou mais nova três anos
Que o reitor da freguesia.
– (É grande consolação!)
– Tenho ainda outros dois manos
Que mais velhos do que eu são,
Porém, como eu lhe dizia,
Doutor… – Que mais sente então?
– A vista sinto estragada,
Até já me custa a ler,
Demais a mais sou nervosa.
Isso não lhe digo nada!
Olhe, estou sempre a tremer.
– Dá licença? – Entre quem é.
– Muitos bons dias. – Olé,
Por aqui, minha senhora?
Desculpe Vossa Excelência
Se a não conhecia agora.
– Sem mais… À sua ciência
Recorrer venho. – Deveras?
(Senhor me dê paciência!
Nunca tu cá me vieras).
Então que temos? – Padeço.
– Sim? porém de que doença?
– Essa é boa! acaso pensa
Que eu porventura a conheço?
– Ah! não conhece? – Quem dera!
Então não o consultava.
– (E eu que muito estimava).
Mas diga, então? – Eu lhe conto…
Oiça bem. Não perca um ponto.
– Nem um ponto hei-de perder.
– Ai, doutor, doutor, meu peito…
– É do peito que padece?
Quem havia de o dizer!
– E Jesus, doutor, parece
Que me quer interromper?!
Não era a isso sujeito.
– Nem o tornarei a ser…
Vamos lá. – Ora eu começo…
Atenção é o que lhe peço;
Diga-me: que lhe pareço?
Não me acha muito abatida?
– Assim, assim; mas às vezes
A vista pode enganar.
– Não, não. Pode acreditar
Que há já um bom par de meses
É um tormento esta vida.
– Então que é o que sente?
–O que sinto? Ora eu lhe digo:
O doutor é meu amigo?
– Oh! senhora… – E é prudente?
Oiça, pois: Eu dantes era
Fera e rija, que era um gosto!
Ou em Dezembro ou Agosto
Correr o mundo pudera,
Sem no fim me achar cansada.
– E hoje? – Não lhe digo nada,
Nem comigo posso já.
– Mau é! – Quer saber, doutor?
Só para vir até cá,
Que tormentos não passei!
– Diga-me, se faz favor.
Que idade tem? – Eu nem sei…
Eu sou mais nova três anos
Que o reitor da freguesia.
– (É grande consolação!)
– Tenho ainda outros dois manos
Que mais velhos do que eu são,
Porém, como eu lhe dizia,
Doutor… – Que mais sente então?
– A vista sinto estragada,
Até já me custa a ler,
Demais a mais sou nervosa.
Isso não lhe digo nada!
Olhe, estou sempre a tremer.
– Faço ideia. – Andava ansiosa
Por consultar o doutor;
Eu tenho em si muita fé.
– Lisonjeia-me. – Outra queixa…
Que eu sofro também… – Qual é?
– É dum forte mal de dentes.
Todos me caem. – Bem, bem.
– E os que restam, mal assentes,
Qualquer dia vão também.
– É provável. – Ai, doutor!
Que cruel enfermidade!
Não acha? – Acho e o pior…
– Há-de curar-se, não há-de?
– E então não sente mais nada?
– Nada… ai, sim, tem-me parecido,
Porém, talvez me iludisse…
– Diga. – A semana passada,
Como ao espelho eu me visse…
Pareceu-me ter percebido…
– O quê? – Que a pele não era
Como dantes, tão macia.
– E então? – Quem me visse dissera
Que eram rugas. – (Eu dizia)
E é isso o que padece?
– Ainda pouco lhe parece,
Doutor? – Por certo que não.
– Então que doença tenho?
– Em sabê-lo muito empenho
Sempre tem? – Eu? Pois então?
Para isso o procurei.
– Bem, então sempre lho digo
Mas julgo não ficarei
Por isto, seu inimigo.
– Ó meu doutor! – O seu mal
É, senhora, de algum perigo.
– Ai Jesus! – E muita gente
Dele morre. – Oh Santo Deus!
Por quem é, não diga tal!
E… morre-se de repente?
– Conforme. – Pecados meus?
E então é isso o que pensa!
Porém ainda não me disse
O nome dessa doença
E eu sempre o quero saber…
– O nome? – Sim. – É… velhice!
…………………………………
– E o remédio? – Morrer.
Janeiro de 1860
Por consultar o doutor;
Eu tenho em si muita fé.
– Lisonjeia-me. – Outra queixa…
Que eu sofro também… – Qual é?
– É dum forte mal de dentes.
Todos me caem. – Bem, bem.
– E os que restam, mal assentes,
Qualquer dia vão também.
– É provável. – Ai, doutor!
Que cruel enfermidade!
Não acha? – Acho e o pior…
– Há-de curar-se, não há-de?
– E então não sente mais nada?
– Nada… ai, sim, tem-me parecido,
Porém, talvez me iludisse…
– Diga. – A semana passada,
Como ao espelho eu me visse…
Pareceu-me ter percebido…
– O quê? – Que a pele não era
Como dantes, tão macia.
– E então? – Quem me visse dissera
Que eram rugas. – (Eu dizia)
E é isso o que padece?
– Ainda pouco lhe parece,
Doutor? – Por certo que não.
– Então que doença tenho?
– Em sabê-lo muito empenho
Sempre tem? – Eu? Pois então?
Para isso o procurei.
– Bem, então sempre lho digo
Mas julgo não ficarei
Por isto, seu inimigo.
– Ó meu doutor! – O seu mal
É, senhora, de algum perigo.
– Ai Jesus! – E muita gente
Dele morre. – Oh Santo Deus!
Por quem é, não diga tal!
E… morre-se de repente?
– Conforme. – Pecados meus?
E então é isso o que pensa!
Porém ainda não me disse
O nome dessa doença
E eu sempre o quero saber…
– O nome? – Sim. – É… velhice!
…………………………………
– E o remédio? – Morrer.
Janeiro de 1860
Nota do autor: A lembrança não é minha absolutamente. Foi-me sugerida de um caso semelhante, que me contaram.
2 comentários:
Já que parece que ninguém quer o prémio, respondo eu: para quem não identificasse pelo retrato bastava guglar o nome, aparecia logo Júlio Dinis na Wikipédia! Por acaso tenho a obra completa do homem, edição Círculo de Leitores, e este "Uma Consulta" aparece no 2º Volume, Poesias. Nos tempos em que lia tudo que me passava pelas mãos li certamente este poema, mas se não tivesse sido aqui postado acho que não mais me lembraria dele, foi há muitos, muitos anos.
eu não sabia sequer k ele tb era poeta.
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