22 junho 2012

Números são números


Mas quando as pessoas decidem que os números são mais importantes do que as pessoas, os números tornam-se o centro da vida.
Assim, o governo do sucesso, o governo que dizia estar a fazer tudo como deve ser feito, o governo que até já falava em devolver o que roubou aos funcionários públicos, é o mesmo que agora deita as mãos à cabeça por ter recusado o óbvio: quando as pessoas não consomem a economia afunda-se (vivemos numa economia de consumo). A isso tem de se juntar a gula dos mercados, que se alimentam de juros. E que podem dizer coisas tão profundas como esta: O magnata norte-americano Donald Trump defendeu que a instabilidade na Europa representa nesta altura uma "grande oportunidade" para os investidores internacionais, uma vez que se pode "conseguir tudo a troco de nada". Trump incentiva os homens de negócios a aproveitarem-se de países como a Espanha: "Um país fantástico que está febril". Veja-se: houve uma explosão nos gastos com juros e um desvio na cobrança de receita de impostos maior do que o esperado. Assim, o défice dos dois subsectores (administração central e Previdência) passou de 194 milhões de euros nos primeiros cinco meses de 2011 para 1238 milhões no mesmo período deste ano, o que se traduz numa subida de 537% (seis vezes mais), com base nos dados da Direcção-Geral do Orçamento. Apesar de, mesmo num contexto de alto desemprego e de redução de salários e pensões, a colecta de IRS ter aumentado mais de 12%. O défice do Estado rondou os 2700 milhões de euros nos cinco primeiros meses do ano, mais 35% do que em igual período do ano passado, fruto não só da queda da receita fiscal, mas também do aumento da despesa.
Fontes: 1,2,3

19 junho 2012

Adeus 

Adiós 

Arrivederci 

Ciao

Au revoir 

Auf wiedersehen 

Goodbye 

Adiaǔ 

Sayonara 

Namaste 

Blessaður 

Cześć 

Tashi Delek

01 junho 2012

Ainda e sempre o que importa

Mesmo depois de uma intensa cultura televisiva (filmes, séries, documentários, debates, noticiários) a população continua a ser encantada pelas vozes que, cá e lá fora, falam como se estivessem num coro sob a batuta de um maestro comum. O encantamento é quebrado pelas vozes do contra, as quais, por serem do contra, só encontram eco em quem também é do contra, ou seja, minorias (mesmo que relativamente numerosas).
Como quebrar esse encantamento? Até agora não se conseguiu. A população resiste e permanece crente, mesmo que já saiba que os reis não recebem o poder de Deus. Ou que insista no"eles são todos iguais". A população tem o dom de apostar na igualdade, como se vê na hora certa acorrer às urnas, onde sempre premeia a igualdade. Será que quando a população se refere à igualdade apenas reclame para si própria a legitimidade da ilegalidade ou tratar-se-á de algo ainda mais refinado?
Como sou um tanto ou quanto limitado, opto pela transcrição de alguns cabeçalhos e leads dos jornais de hoje:

«Arcebispo de Braga diz que quase se engasgou com valor da reforma de Jardim Gonçalves» (jornal i) / «O arcebispo de Braga, Jorge Ortiga, confessou hoje que quase se engasgou quando esta manhã tomava o pequeno-almoço e leu que o antigo presidente do BCP, Jardim Gonçalves, recebe uma reforma de cerca de 175 mil euros.»

«Portugal arrisca pôr-se a caminho do Terceiro Mundo, diz Teodora Cardoso» / «A presidente do Conselho de Finanças Públicas, Teodora Cardoso, considera que a política de cortes salariais aconselhada pela troika e seguida pelo Governo pode pôr Portugal a caminho do Terceiro Mundo. “Hoje em dia é praticamente impossível um país desenvolvido, como, apesar de tudo, nós somos, andar a competir com os países muito mais pobres do que nós, com níveis de rendimento e, portanto, de salários muitíssimo baixos”, sustentou numa entrevista à Antena 1. “Se o nosso nível de competitividade quer ir para esse lado, isso significa que, então, nós nos estamos a candidatar a passar para o Terceiro Mundo, se não para o quarto.”» (jornal Público

«PCP diz que renegociação da dívida será inevitável» / «No encerramento do debate agendado pela sua bancada sobre a renegociação da dívida, o líder parlamentar comunista, Bernardino Soares, afirmou que "a alternativa que está em discussão não é renegociar ou não renegociar, é renegociar agora com algumas condições ou renegociar depois". "Não há alternativa à renegociação, a opção é termos uma palavra a dizer agora ou não termos uma palavra a dizer e esta ser-nos imposta de forma abrupta", declarou, rejeitando as acusações da maioria de que renegociar significa "não pagar". O deputado do PCP sublinhou que renegociar "é rever os prazos, as taxas de juro e eliminar a dívida ilegítima. Há juros agiotas e especulativos têm de ser julgados e condenados"» (TSF).

15 maio 2012

A democracia de que não se gosta

Não falta por aí quem perore sobre a democracia. Perorar é fácil, o pior é quando, como na Grécia, a democracia se alia ao populismo e o país fica ingovernável: «Os levantamentos de depósitos dos bancos gregos ascenderam a 700 milhões de euros na segunda-feira, um dia antes da reunião de "última oportunidade" para a formação de um governo de coligação, informou hoje o portal da presidência grega.» [fonte] Teme-se a continuação da sangria, até porque já vai em 16 mil milhões de euros o montante depositado pelos gregos no estrangeiro desde 2009, ano em que começou a crise da dívida soberana grega.

Da pena de morte

Às vezes acontece, a morte apanha-nos desprevenidos. Se a morte vem disfarçada de justiça a gente torce o nariz, pois errar é humano e erra-se muito para mostrar serviço ou porque se está sob o jugo do preconceito. Nos EUA há vários casos de inocentes condenados à morte. Agora fala-se de Carlos DeLuna que, em 1989, foi condenado à morte por um assassínio que não cometeu. A justiça falhou ou limitou-se a cumprir o seu papel social?
 Descubra as diferenças
Em Portugal há muito que se eliminou tal pecha dos códigos de justiça, mas o assunto às vezes comparece pela vox populi e há sempre quem deseje fazer justiça pelas próprias mãos. Quando o assunto é o outro é sempre fácil julgar. E errar. Nos EUA isso acontece dentro do próprio sistema judicial, algo que deveria fazer pensar os texanos e outros estados que conservam a pena de morte.

26 abril 2012

Simon Armitage

Sold to the Lady in the Sunglasses and Green Shoes

My girlfriend won me in a sealed auction but wouldn't
tell me how much she bid. "Leave it, Frank. It's not
important. Now go to sleep," she said. But I was restless.
An hour later I woke her and said, "Give me a ballpark
figure." "I'm tired," she replied. I put the light on. "But
are we talking like thousands here?" She rolled away,
pulled the cotton sheet over her head, mumbling, "You're
being silly, Frank." I said, "Oh, being silly am I? So not
thousands. Just a couple of hundred, was it?" "I'm not
telling you, so drop it," she snarled. By now I was wide
awake. "Fifty, maybe? A tenner?" She didn't say anything,
and when Elaine doesn't say anything I know I'm getting
close to the truth. Like the other day with the weed killer.
I said, "Maybe you weren’t bidding for me at all. Maybe
you were after a flat-screen telly or a home sun-tanning
unit, and you got me instead. Tell me, Elaine. Tell me
what I'm worth, because right now I don't know if I'm
an original Fabergé egg or just something the cat dragged
in." Elaine surfaced from under the covers and took a sip
of water from the glass on the bedside table. "Frank, listen.
What does it matter if it was a million pounds or a second-
class stamp? You're priceless, OK? You're everything to
me. Don't spoil it by talking about money." Then she took
my hand and held it against her breast and said, "Do you
want to make love?" I answered with my body, tipping
every last quicksilver coin into her purse.

But that night I dreamed of the boy-slave winning his
freedom by plucking a leaf from Diana's golden bough,
and long before dawn, with bread in my knapsack and
the wind at my back, I strode forth.

From  Seeing Stars

Mary Jo Salter

Peonies

Heart-transplants my friend handed me:
four of her own peony bushes
in their fall disguise, the arteries
of truncated, dead wood protruding
from clumps of soil fine-veined with worms.

"Better get them in before the frost."
And so I did, forgetting them
until their June explosion when
it seemed at once they'd fallen in love,
had grown two dozen pink hearts each.

Extravagance, exaggeration,
each one a girl on her first date,
excess perfume, her dress too ruffled,
the words he spoke to her too sweet--
but he was young; he meant it all.

And when they could not bear the pretty
weight of so much heart, I snipped
their dew-sopped blooms; stuffed them in vases
in every room like tissue-boxes
already teary with self-pity.

From A phone call to the future: New and selected poems

Sharon Olds

Possessed

I have never left. Your bodies are before me
at all times, in the dark I see
the stars of your teeth in their fixed patterns
wheeling over my bed, and the darkness
is your hair, the fragrance of your two heads
over my crib, your body-hairs
which I count as God counts the feathers of the sparrows,
one by one. And I never leave your sight,
I can look in the eyes of any stranger and
find you there, in the rich swimming
bottom-of-the-barrel brown, or in the
blue that reflects from the knife's blade,
and I smell you always, the dead cigars and
Chanel in the mink, and I can hear you coming,
the slow stopped bear tread and the
quick fox, her nails on the ice,
and I dream the inner parts of your bodies, the
coils of your bowels like smoke, your hearts
opening like jaws, drops from your glands
clinging to my walls like pearls in the night.
You think I left--I was the child
who got away, thousands of miles,
but not a day goes past that I am not
turning someone into you.
Never having had you, I cannot let you go, I
turn now, in the fear of this moment,
into your soft stained paw
resting on her breast, into your breast trying to
creep away from under his palm--
your gooseflesh like the shells of a thousand tiny snails,
your palm like a streambed gone dry in summer.

From The dead and the living

Marie Howe

After the Movie

My friend Michael and I are walking home arguing about the movie.
He says that be believes a person can love someone
and still be able to murder that person.

I say, No, that's not love. That's attachment.
Michael says, No, that's love. You can love someone, then come to a day

when you're forced to think "it's him or me"
think "me" and kill him.

I say, Then it's not love anymore.
Michael says, It was love up to then though.

I say, Maybe we mean different things by the same word.
Michael says, Humans are complicated: love can exist even in the murderous heart.

I say that what he might mean by love is desire.
Love is not a feeling, I say. And Michael says, Then what is it?

We're walking along West 16th Street - a clear unclouded night - and I hear my voice
repeating what I used to say to my husband: Love is action, I used to say to him.

Simone Weil says that when you really love you are able to look at someone you want to eat and not
       eat them.

Janis Joplin says, take another little piece of my heart now baby.

Meister Eckhart says that as long as we love any image we are doomed to live in purgatory.

Michael and I stand on the corner of 6th Avenue saying goodnight.
I can't drink enough of the tangerine spritzer I've just bought -

again and again I bring the cold can to my mouth and suck the stuff from the hole the flip top made.

What are you doing tomorrow? Michael says.
But what I think he's saying is "You are too strict. You are a nun."

Then I think, Do I love Michael enough to allow him to think these things of me even if he's not
       thinking them?

Above Manhattan, the moon wanes, and the sky turns clearer and colder.
Although the days, after the solstice, have started to lengthen,

we both know the winter has only begun.

 From The Kingdom of Ordinary Time

17 abril 2012

O povo leva no pêlo e gosta

Mas é preciso explicar bem, diz o mestre Marcelo. Ou seja, é preciso dizer à maralha que se o governo corta é porque é preciso cortar, pois se há coisa que a maralha sabe é que o governo sempre faz o melhor (porque será que o mestre Marcelo diz sempre tão mal dos sucessivos governos é que não se percebe - mas isso é outra história).
Citando: "O Governo tem que esclarecer - e certamente irá esclarecer os portugueses acerca da situação da segurança social, os problemas que existem, os problemas que existem hoje, problemas que existem a curto prazo e problemas que existem a médio e longo prazo", disse Marcelo Rebelo de Sousa à agência Lusa.

Já outras pessoas, menos doutoráveis e televisionáveis dizem preto no branco: "A Segurança Social não tem qualquer problema de sustentabilidade. Dizer agora que a Segurança Social tem problemas de sustentabilidade porque regista o pior ano contabilístico desde 1994 é como ter dito, no passado, que nada precisava de mudar. O que é estranho não é vivermos o pior ano desde 1994, o que é espantoso é a Segurança Social não ter o pior ano de sempre. Portugal nunca viveu em democracia uma recessão tão grave com uma taxa de desemprego tão elevada e reduções salariais nominais tão significativas."
A conclusão é óbvia: "Insegurança. Assim se pode sintetizar o tempo em que vivemos. Como se estivéssemos em estado de guerra. Insegurança no rendimento que levamos para casa fruto do trabalho, insegurança no desemprego, na doença e na velhice. Todos os contratos são quebrados. Todos? Não, há alguns que continuam bem protegidos."

Eles dizem fooking mas é Fucking

Fucking Devagar Por Favor

O Focko's people de uma aldeia austríaca, situada a cerca de 30 quilómetros de Salzburgo, ponderam mudar o nome da aldeia por causa da associação com a a palavra inglesa. Todos os anos, os habitantes deparam-se com várias turistas e mulheres semi-nuas a serem fotografadas ao lado das placas onde o nome da localidade está inscrito.



Para os austríacos, o termo tem origem no apelido Focko, nobre oriundo da Bavária, região do Sul da Alemanha, e remonta ao século VI. Sofreu evoluções, passando a Vucchingen em 1070, Fukching em 1303, Fugkhing em 1532,até chegar a Fucking no século XVIII.



Agora, os 104 habitantes querem mudar a nome da aldeia para Fogging, denominação que foi extinta no século XVI.


10 abril 2012

Da homofobia

As pessoas que têm mais reações contra os homossexuais são aquelas que apresentam maior atração por pessoas do mesmo sexo e que cresceram em ambientes familiares que reprimiram esses mesmos sentimentos, lê-se nas conclusões de um estudo internacional. As conclusões constam de um estudo que incidiu em 160 universitários, na Alemanha e nos Estados Unidos da América, agora publicado no Revista da Psicologia da Personalidade e Social (Journal of Personality and Social Psychology).
Conduzido por investigadores das universidades de Rochester, de Essex e de Santa Bárbara (Califórnia), o estudo é o primeiro que analisou o papel dos pais e da orientação sexual na construção do medo intenso ou de ódio aos homossexuais.

Fonte: JN

Portugal derrapa e perde os passos para as tartarugas

Há quem seja lambe botas por natureza. Veja-se o caso deste colunista que (ingenuamente) quer ensinar o padre nosso ao vigário, tão preocupado com a propaganda do governo. Na verdade, mostra que o que importa (para ele) não é o que se faz, mas o que se "comunica". Lambe botas e idiota (quiçá porque falho de ideias)...
A realidade, claro, não passa cartão a opiniões e segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a actividade económica em Portugal deverá continuar a cair. A deterioração das perspectivas de crescimento de Portugal têm vindo a agravar-se e acumulam já mais de doze meses consecutivos em queda, estando significativamente abaixo da média de longo prazo e das médias estimadas para o conjunto da zona euro e da OCDE.
Mário Soares vem a terreiro recordar algo que muitos esquecem na espuma dos dias: "o despesismo do Estado e das empresas públicas continua. Dos grandes "buracos" fala-se pouco e dos casos escandalosos também não. Os responsáveis estão impunes. Tudo continua por esclarecer... Para onde tem ido o dinheiro que o Estado já recebeu? Não se sabe."
Passos Coelho é meticuloso a destruir o Serviço Nacional de Saúde, a dinamitar a escola pública e a retirar direitos a quem trabalha, mas ainda não foi capaz de diminuir as rendas da EDP; não foi capaz de diminuir as gorduras do Estado; não foi capaz de estancar os desperdícios de dinheiros públicos (de que os recentes milhões da Lusoponte são mero exemplo)... Ou seja, Passos Coelho é, de facto, tão mau primeiro-ministro como Sócrates no que se trata em resolver a crise. Mas tem a agravante de ter dito que resolveria coisas que não resolveu e de nos ter esganado muito mais do que o PEC IV esganava.

06 abril 2012

Fim do estado de graça?

As vozes que já se fazem ouvir, até há pouco intimamente conotadas com o governo e agora de sinal contrário, mostram que se avizinham dias complicados.
Diz Vítor Bento: A protecção de que dispõe o sector não transaccionável da economia, e que, como é público, considerei há tempos como o "nó cego da economia", continua praticamente intocada. Se dúvidas houver, vejam-se os aumentos salariais aí praticados quando a economia está em profunda recessão e o desemprego em 15%. Por isso, este é o sector que continua a atrair investimento estrangeiro. Este é importante, sem dúvida, na situação de carência em que o País vive. Mas trata-se de investimento que, na prática, é apenas financeiro - certamente não desinteressado das rendas do sector -, mas sem impacto no stock de capital ou na criação de emprego. (fonte)
Pacheco Pereira vai mais longe e diz, preto no branco, que "É evidente a má-fé do primeiro-ministro, que prometeu e não cumpriu", ao ter estendido o corte nos subsídios de Natal e de férias até ao final da vigência do programa de assistência financeira a Portugal. (fonte)
Para os fanáticos do PSD ou do PP o governo tudo faz com a melhor das intenções. Ou seja, mesmo que lhes dêem na cabeça os fanáticos mantêm-se indefectíveis. O problema é haver gente que a cada ano que passa tem de reorganizar a sua vida e cada vez menos acredita nas promessas do governo. Já percebeu que entre Sócrates e Passos Coelho a diferença é a favor de Sócrates, pois este ainda não tinha mexido em subsídios.
Esta percepção indicia uma mudança latente na maioria do eleitorado que deu a vitória ao PSD e que o levou a formar governo com o PP.


04 abril 2012

Passos o mentiroso? Não, o herói da retórica. O puro génio

Passos Coelho é um génio. O governo de Portugal é o espelho desse génio. Quando a questão é aliciar a populaça vale tudo e as palavras saem doces como algodão (haverá quem ache isso um bocado enjoativo, mas, no geral, a maioria gosta). Dizem que Portugal vai crescer já para o ano. Mas quando se trata de salários, tudo muda. Aí, já o discurso é feito de limalha de ferro: "Nós sabemos que não podemos repor esses subsídios automaticamente no dia seguinte, o que quer dizer que tem de haver um processo que nos vá permitindo ao longo do tempo repor esses subsídios. Qual é o grau de reposição? Quanto tempo vai demorar? Não sabemos. E não sabemos porquê? Porque eu não conheço as condições que vão existir em 2014 ou em 2015". (fonte)
Os funcionários públicos deveriam receber todos menos do salário mínimo. Para que Passos Coelho e os demais governantes possam auferir vencimentos mais elevados.

26 março 2012

Faces da mesma moeda

1 - Enquanto os franceses vivem uma época de ajustes, com o governo a aprovar medidas de contenção e planos de poupança orçamental, Nicolas Sarkozy não pode dizer que esteja a ser afectado. A sua fortuna aumentou mais de meio milhão de euros desde que subiu ao poder.

2 - O principal tesoureiro do Partido Conservador, Peter Cruddas, foi filmado por jornalistas do Sunday Times a propor acesso “de primeira linha” ao primeiro-ministro David Cameron por um financiamento partidário de 250 mil libras (quase 300 mil euros). E vai mais longe, garantindo que os encontros com David Cameron são bons para recolher “muita informação” e garante que fará chegar ao primeiro-ministro todas as sugestões: “Terão a oportunidade de lhe perguntar praticamente tudo o que quiserem”. Cameron, muito agastado com a notícia, nega obviamente que tal aconteça.

3 - Intervenientes dos confrontos de quinta-feira, no Chiado, garantem que as imagens de violência nas esplanadas foram registadas depois de uma primeira actuação da polícia. Já o ministro que tutela as polícias manifesta-se preocupado... com os jornalistas. "Aquilo que aconteceu que se traduz na situação dos jornalistas é uma situação que eu lamento. Foram tomadas as medidas que deviam ser tomadas, no imediato, a Inspecção-geral da Administração Interna vai proceder à averiguação daquelas circunstâncias. A PSP disse já também sobre essa matéria está a proceder às averiguações daquilo que se passou", afirmou Miguel Macedo.

Cortam para enriquecer. Aceitam subornos para se manterem no poder. Mandam a polícia ser dura para fazer passar a mensagem de que quem arrebita cabelo sujeita-se a levar no trombil. E negam sempre tudo. E sempre com o ar mais seráfico de que são capazes.
Porque o que importa é a "defesa da democracia" "garantir a paz pública", fazer com que as pessoas vivam "tranquilamente", dar a ideia de que os cidadãos têm na mão a "condição absoluta do exercício das liberdades".

25 março 2012

Et maintenant la valse

Beethoven ou «Butthoven's 5th Symphony»

Ao ritmo das nádegas de Michelle L'Amour

Antonio Tabucchi (1943-2012)



Num curto espaço de tempo Itália perde dois nomes maiores da sua literatura: Tonino Guerra e Antonio Tabucchi.


Ambos com ligações a Portugal. Tabucchi talvez fosse o escritor italiano mais português, tanto que, ao que se sabe, morreu hoje em Lisboa. Antonio Tabucchi dedicou um livro aos Açores, A mulher de Porto Pim:

Post Scriptum
Uma baleia vê os homens

Sempre tão atarefados, e com longas barbatanas que agitam com frequência. E como são pouco redondos, sem a majestosidade das formas acabadas e suficientes, mas com uma pequena cabeça móvel onde parece concentrar-se toda a sua estranha vida. Chegam deslizando sobre o mar, quase como se fossem pássaros, e infligem a morte com fragilidade e graciosa ferocidade. Permanecem longo tempo em silêncio, mas depois entre eles gritam com fúria repentina, com um amontoado de sons que quase não varia e aos quais falta a perfeição dos nossos sons essenciais: chamamento, amor, pranto de luto. E como deve ser penoso o seu amar-se: e áspero, quase brusco, imediato, sem uma macia capa de gordura, favorecido pela sua natureza filiforme que não prevê a heróica dificuldade da união nem os magníficos e ternos esforços para a realizar.
Não gostam da água e têm medo dela, e não se percebe porque a frequentam. Também eles andam em bandos mas não levam fêmeas e adivinha-se que elas estão algures, mas são sempre invisíveis. Às vezes cantam, mas só para si, e o seu canto não é um chamamento, mas uma forma de lamento angustiado. Cansam-se depressa, e quando cai a noite estendem-se sobre as pequenas ilhas que os transportam e talvez adormeçam ou olhem para a lua. Vão-se embora deslizando em silêncio e percebe-se que são tristes.

in A mulher de Porto Pim, Difel, págs. 94-5

20 março 2012

Os mercados provavelmente enganam-se

A especulação é a norma. O resto é folclórico e tem por objectivo constranger os países a jogar segundo regras que aceitam quando pedem emprestado. Ou isso se pensa ao ler afirmações como esta: "a reestruturação da dívida da Grécia que causou pânico no mercado obrigacionista e provavelmente provocou uma recessão desnecessária na Europa".
Todos os países recorrem aos "mercados" para se abastecerem de dinheiro. Os ditos analisam a situação financeira do país, o risco envolvido e taxam supostamente em função disso. Mas sabe-se que não é assim. Há países como a Espanha que são altamente penalizados e outros como os EUA, a França, Inglaterra ou Alemanha que são altamente beneficiados.
Vir dizer que os investidores estão preocupados em saber como vai Portugal desencantar "os 9,7 mil milhões de euros de obrigações cuja maturidade terminam em Setembro de 2013 e que não estão cobertos pelo resgate de 78 mil milhões" e recordar que as yields das obrigações portuguesas a cinco anos continuam perto dos 16%, é mostrar como os mercados apenas querem ganhar dinheiro fácil com os aflitos. Seguem, aliás, o mesmo raciocínio que se aplica nos países em crise: quem paga mais é quem menos tem. Chama-se a isto justiça mercantil ou negócio. Antigamente chamavam-lhe agiotagem.

Sonae, amiga, o povo acredita na cantiga

«O volume de descontos concedidos em cartão e talão aos clientes das áreas de retalho da Sonae aumentou 23%, para 330 milhões de euros, em 2011 face a 2010, anunciou hoje o grupo. (...) "Num contexto económico adverso, a Sonae manteve-se ao lado dos seus clientes e daqueles que mais necessitam, contribuindo para aliviar as dificuldades que as famílias enfrentam", sustentou o presidente do conselho de administração da Sonae MC, Luís Moutinho.» (fonte)

Eis como as notícias servem interesses particulares. Quem passar os olhos pelo cabeçalho até pensa que a Sonae é generosa. Quem usa as lojas da empresa para fazer compras há muito percebeu que os descontos são uma miragem. Os preços sobem ali a um ritmo vertiginoso. Os descontos não passam de um engodo ou de um modo de chamar a malta para continuar a consumir.

Uma imagem vale mais do que mil palavras


Supõe-se que um país é, por definição, algo mais importante do que uma empresa. Até porque um país é composto por gente e dela depende a vitalidade, a força, a energia do mesmo.
Mas, no caso de Portugal, o país soçobra perante os interesses da EDP. A EDP tem mais força. Pode não só demitir um secretário de estado como é capaz de dar a volta à troika.
As pessoas podem:
a) ser obrigadas a emigrar;
b) passar fome;
c) cair no desemprego;
d) sair da sua "zona de conforto";
e) perder a casa;
f) bater palmas ao governo.
Já o governo:
1) Não consegue sair da sua zona de conforto;
2) Andou para aí a prometer transparência e já se viu que a única transparência é a da pobreza, a de ter de ir a uma instituição de caridade mendigar sopa;
3) Continua a manter as rendas dos senhores grandes, como os da EDP;
4) Faz de conta que governa enquanto vai servindo os jobs aos boys.

A nobreza dos que espezinham quem trabalha e lambem o rabinho (tão carinhosos somos que usamos este diminutivo) aos que ganham milhões (parte dos quais conseguidos a roubar os pobrezinhos e os coitadinhos que precisam de energia e de luz) é uma nobreza cocó ou da merda. E a merda é tanta que a verdade sai pela voz do arauto: Marcelo Rebelo de Sousa acredita na reeleição do actual primeiro-ministro, considerando que tem feito uma boa gestão da sua imagem.
Repare-se que não é por governar bem é por cosmética. No fim do mandato o país terá regredido 20 anos. Mas Passos Coelho ficará muito bem no retrato. Talvez seja de propor que se façam já cópias emolduradas para tudo o que é instituição pública e que se prepare uma disciplina no ensino obrigatório para enaltecer a figura do homem que nos salvou do abismo: o bom gestor de imagem Passos Coelho.

Essa coisa proibida e nojenta

Fumar é cada vez mais atentar contra a moral e os bons costumes. Uma pessoa pode ser um crápula, fazer a vida negra aos outros, tratar toda a gente como lixo - coisas que se desculpam se a pessoa em causa for ou rica, ou televisionável, ou um político. Já se fumar um cigarro é banido do grémio. Que o diga Fábio Coentrão.

15 março 2012

Um português que se enganou no sítio e na língua



“Chamo-me Clarence. Sou um ponto de acesso à Internet 4G.” A frase, estampada na t-shirt usada por Clarence e outros 12 sem-abrigo de Austin durante o festival de cinema, música e tecnologia South By Southwest, era um sinal para que todos os utilizadores de telemóveis, tablets e computadores portáteis que passeavam pelas ruas da cidade texana pudessem aceder à Web.

“O South By Southwest de 2012 pode ser resumido desta forma: uma empresa de marketing com um nome impossível, chamada Bartle Boogle Hegarty, está a levar a cabo uma pequena experiência de ciências humanas denominada 'Homeless Hotspots'. Dão aparelhos de acesso à Internet a pessoas sem-abrigo, juntamente com uma t-shirt. Na t-shirt não está escrito ‘Eu tenho um ponto de acesso 4G’. Está escrito ‘Eu sou um ponto de acesso 4G’”.

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Dia do Consumidor: como poupar em 6 passos simples

1.º Deixar de pôr gasolina ou gasóleo no popó ou fazê-lo apenas uma vez por mês, num montante baixo. Dispensar também os transportes públicos (como um verdadeiro amigo do ambiente);

2.º Deixar de ir ao supermercado ou à mercearia para adquirir bens de primeira necessidade, ir apenas para desentorpecer as pernas. Para comer procurar a fila da sopa dos pobres (atenção: não esquecer de usar na lapela um pin com o rosto simpático e sorridente do senhor primeiro-ministro de Portugal);

3.º Para poupar electricidade desligar os aparelhos domésticos (TV, frigorífico, etc.), contribuindo de modo exemplar para uma boa pegada ecológica;

4.º Reciclar a roupa velha que se tem em casa (é cool, seja lá o que isso for), potenciando a criatividade e a inovação;

5.º Como a sopa dos pobres é uma incógnita e pode passar dias sem comer, meter baixa ao serviço ou pura e simplesmente deixar de ir trabalhar (acabando assim por perder o salário e consequentemente deixar de pagar impostos);

6.º A pouco e pouco sentir-se-á leve, muito leve. É a morte que, tão querida e simpática como o senhor primeiro-ministro, o visita com um passaporte para o paraíso.

Quando a alma de um português ascender a tão azul e puro lugar (no céu metafórico a poluição não chega) pede-se que a filarmónica do lugar toque o hino nacional. É que o pouco dinheiro que tiver amealhado será entregue ao Estado português para que algum senhor do PSD ou do CDS-PP possa vir sorrir à TV (que estará desligada, claro, mas o que importa é o gesto).

Da pátria portuguesa e dos nobres lusitanos

Vivemos tempos mínimos, em que as boas intenções contaminam os discursos do poder, mas não as práticas. Em que as empresas continuam a actuar como se o Estado fosse uma vaca leiteira, pois o nobre e alto objectivo dos donos das empresas é o lucro e não há, dizem, valor mais absoluto. Tempos em que o Estado esmaga os pequenos para servir os interesses dos grandes. Tudo sob cobertura jornalística, ou seja, sob o manto diáfano da indiferença.
Assim, enquanto Henrique Gomes, ex-secretário de Estado da Energia, diz que a manutenção dos lucros excessivos decorrentes das garantias dadas pelo Estado ao negócio da energia desviará das famílias e das empresas mais de 3500 milhões de euros até 2020, o presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) tenta pôr água na fervura, afiançando ser «prematuro» afirmar que as tarifas de electricidade vão aumentar 10 por cento, em 2013.
Já as empresas nacionais, exemplo de verdadeiro patriotismo, podem pôr os olhos na Lusoponte, que entregou um pedido de indemnização por parte do Estado no valor de 100 milhões de euros. Porquê? Pelo «risco de variação dos impostos».
Como se percebe, as empresas recebiam do Estado verdadeiras fortunas. Isto é, dinheiro que nos é tirado em impostos serve para meia dúzia enriquecer.
Mas o discurso é sempre: contra o trabalho. Contra quem é assalariado médio e baixo. Esses pagam a factura e são apontados como os culpados da coisa. Por dever patriótico.
A pátria tem sido uma bocadinho puta. É toda oferecida a quem devia pagar e cobra couro e cabelo a quem está liso.

13 março 2012

A acácia, uma espécie altamente política


Não são precisas muitas acácias para alterar um ecossistema. Apenas uma pode alterar os solos, através de interacções invisíveis, e a uma distância muito maior do que o pensado.

As estratégias de sobrevivência da acácia (Acacia longifolia), originária do Sul da Austrália e da Tasmânia, foram reveladas numa duna costeira de Pinheiro da Cruz, no concelho de Grândola, por investigadores do Centro de Biologia Ambiental da Universidade de Lisboa e do Departamento de Ecologia Experimental e de Sistemas da Universidade alemã de Bielefeld.

A espécie, trazida para Portugal para fins ornamentais e para fixar os solos, tornou-se numa ameaça descontrolada e uma dor de cabeça para associações florestais, municípios, empresas e particulares. E não é por desfear a paisagem; a árvore compete com as plantas nativas pelos recursos, nomeadamente pela água, e altera o funcionamento do solo.

“Assim que uma simples acácia se instala numa zona, e antes de nos apercebermos que está em curso uma invasão desta espécie exótica, a planta deixa imediatamente a sua marca no sistema e altera-o para seu próprio benefício” diz Cristina Máguas, do Centro de Biologia Ambiental. À medida que as acácias se multiplicam e cobrem o ecossistema “vão abafando o espaço das outras plantas”.

Ler mais aqui.

O Estado, esse nosso amigo

Citamos este artigo:

«A Brisal, concessionária da Auto-estrada do Litoral Centro, que liga a Marinha Grande a Aveiro, reclama uma indemnização de mil milhões de euros ao Estado pelas quebras de tráfego verificadas.
(...)
Este processo surge poucos dias depois de a Lusoponte se recusar a devolver os 4,4 milhões de euros pagos em duplicado - pelo Estado e pelos utilizadores da ponte 25 de Abril - durante o último mês de Agosto. O que têm estas situações em comum? A má preparação do sector público na negociação e assinatura de contratos com privados. (...) É fácil dizer que o Estado tem de renegociar todos contratos de concessão e que não deve recorrer a advogados ou outros prestadores de serviços privados porque isso aumenta a despesa pública, o que é difícil é garantir que as estruturas jurídicas existentes na esfera pública são capazes de discutir de igual para igual com o sector privado na defesa dos seus interesses. Os resultados estão à vista, com pedidos de indemnização a atingirem níveis impensáveis porque os contratos não foram devidamente acautelados ou porque o Estado não sabe ou não consegue fazer valer os seus direitos.»

Comentário: O Estado tem rostos e esses rostos são ou pequenos grãos numa engrenagem ou mãos e braços de empresas.
A lei deveria acautelar estas situações (sobretudo num país onde há tanta fúria legislativa) e se a lei não existe, ou é omissa, tal deve-se a uma estratégia de defesa de interesses particulares. DE resto, a reacção do secretário de estado no caso da Lusoponte é sintomático: aos privados paga-se. Ao cidadão anónimo tira-se. O Estado é prepotente e abusador sob a capa da lei.

09 março 2012

Escutem o Zé-Ninguém

Há um livro de Wilhelm Reich, redigido em 1946, que poderia endereçar-se a Sua Excelência o Senhor Presidente da República Portuguesa, Aníbal Cavaco Silva, Escuta, Zé Ninguém!.
Sua Excelência tem o hábito de dizer as coisas de tal maneira que as pessoas não o percebem, sendo o resultado quase sempre lamentável, permitindo que a popularidade de S.ª Exa. seja a mais baixa de que há memória.
Como se não bastasse, a retórica de que serve é, no mínimo, pastelosa. Veja-se: «Pela quarta vez, numa disputa eleitoral em que pessoalmente me submetia ao julgamento dos meus concidadãos, obtive mais de 50% dos votos. Tratou-se de um gesto de confiança dos Portugueses que muito me honra. Senti, naturalmente, o peso desta responsabilidade histórica. A vitória nas eleições de 2011 teve um sabor especial, que reforçou em mim a admiração profunda e o sentimento de gratidão para com o povo português.»
S.ª Exa. tem a mentalidade própria de alguém conservador e, por isso, acha uma aberração o casamento de pessoas do mesmo sexo. Mais, a coisa é de tal forma forte para o delicado estômago de S.ª Exa. que ele chega mesmo a servir-se desse facto como dado de arremesso contra o governo e a maioria que permitiu que tal fosse possível.
Como se diz no tal livrinho de Reich, «não existe nada a que mais fujas do que a encarar-te a ti próprio» Zé Ninguém.
Sim, como pode alguém tolerar que as pessoas sejam livres e vivam como tal? A liberdade é contra natura e constitui sempre uma ameaça aos interesses de desses poucos que se acham empossados pela lei divina.
Só alguém divino é capaz de adivinhar o que dirá a História. Cavaco Silva é um desses iluminados. Afirma sem titubear: «não me congratulo pelo facto de a História me ter dado razão».
nem se lembra que história e memória são indissociáveis. Dar-lhe-á jeito fazer de conta que não fez a primeira campanha a prometer melhor dias aos Portugueses (como ele gosta de escrever). Viu-se. Desde que é presidente, a vida dos Portugueses não tem parado de se afundar.

08 março 2012

A importância da voz

Quando fala um banqueiro a nação verga-se e baba-se. As palavras são sorvidas. Quando fala um dirigente político do PCP ou do BE a nação olha para o lado.
Jerónimo de Sousa, acusou hoje o governo de ser exigente com as classes mais desfavorecidas ao mesmo tempo que permite à Lusoponte receber duas vezes as portagens de agosto na ponte 25 de Abril.
O governo, como se sabe, dividiu-se sobre o assunto. Passos Coelho estava a leste. O secretário de estado disse que sim e que isso era... perfeitamente normal.
Percebe-se. A nação que trabalha precisa de sindicatos para ter alguma protecção. As empresas grandes têm bons advogados para zelar pelos seus interesses.
A nação gosta quando cortam às pessoas o pouco que ganham. E adora que os que já têm muito possam ter ainda mais. É a equidade nacional.

Transcrições

Às vezes não vale a pena acrescentar nada às notícias. Basta seleccionar e ordenar a informação. Aqui fica uma amostra:

Chineses vão receber 144 milhões em dividendos da EDP (Económico).

O Estado vai receber menos dividendos este ano. A venda de parte das posições que mantinha no capital das empresas do sector energético, acordada com a troika no âmbito do programa de assistência financeira, retirou-lhe a possibilidade de encaixar 180 milhões de euros com a remuneração accionista que será paga pela EDP e a REN. (Jornal de Negócios)

A EDP revelou hoje que teve um lucro de 1.125 milhões de euros em 2011, mais 4% do que no ano anterior, e o melhor resultado de sempre para a eléctrica. (idem)

António Mexia: “É a EDP que financia os consumidores” (Público)

As famílias portuguesas têm uma das electricidades mais caras da Europa. A conclusão é de um estudo publicado (...) pelo Eurostat, sobre os preços da electricidade e do gás praticados entre o segundo semestre de 2009 e o de 2010, que diz que Portugal é o nono país da Europa a 27 com a factura da luz mais cara, tendo em conta o valor pago e o custo de vida nacional. (Dinheiro Vivo)

O presidente executivo da EDP, António Mexia, recusa a ideia de que as receitas recebidas pelo grupo em Portugal sejam “rendas excessivas” e considera que “a existência de um défice tarifário corresponde a uma situação em que é a EDP a financiar o sistema”. (Jornal de Negócios)

BCE agrava previsões para a economia do euro (Económico)

BCE lucra mais de mil milhões com compra de dívida soberana (Jornal de Negócios)

O resultado líquido do Banco Central Europeu (BCE) cresceu 325 por cento para 728 milhões de euros no ano passado, face aos 171 milhões de euros registados em 2010, anunciou hoje a entidade liderada por Mario Draghi. (jornal i)

03 março 2012

Fala John Perkins

«Basicamente, aquilo que fazíamos era escolher um país, por exemplo a Indonésia, que na década de 70 achávamos que tinha muito petróleo do bom. Não tínhamos a certeza, mas pensávamos que sim. E também sabíamos que estávamos a perder a guerra no Vietname e acreditávamos no efeito dominó, ou seja, se o Vietname caísse nas mãos dos comunistas, a Indonésia e outros países iriam a seguir. Também sabíamos que a Indonésia tinha a maior população muçulmana do mundo e que estava prestes a aliar-se à União Soviética, e por isso queríamos trazer o país para o nosso lado. Fui à Indonésia no meu primeiro serviço e convenci o governo do país a pedir um enorme empréstimo ao Banco Mundial e a outros bancos, para construir o seu sistema eléctrico, centrais de energia e de transmissão e distribuição. Projectos gigantescos de produção de energia que de forma alguma ajudaram as pessoas pobres, porque estas não tinham dinheiro para pagar a electricidade, mas favoreceram muito os donos das empresas e os bancos e trouxeram a Indonésia para o nosso lado. Ao mesmo tempo, deixaram o país profundamente endividado, com uma dívida que, para ser refinanciada pelo Fundo Monetário Internacional, obrigou o governo a deixar as nossas empresas comprarem as empresas de serviços básicos de utilidade pública, as empresas de electricidade e de água, construir bases militares no seu território, entre outras coisas.

Há algumas centenas de anos, a geopolítica era maioritariamente liderada por organizações religiosas; depois os governos assumiram esse poder. Agora chegámos à fase em que a geopolítica é conduzida em primeiro lugar pelas grandes multinacionais. E elas controlam mesmo os governos de todos os países importantes, incluindo a Rússia, a China e os EUA. A economia da China nunca poderia ter crescido da forma que cresceu se não tivesse estabelecido fortes parcerias com grandes multinacionais. E todos estes países são muito dependentes destas empresas, dos presidentes destas empresas, que gostam de baralhar as pessoas, porque constroem muitos mísseis e todo o tipo de armas de guerra. É uma economia gigante.

(...) a boa notícia é que as pessoas em todo o mundo estão a começar a compreender como tudo isto funciona. Estamos a ficar mais conscientes. As pessoas na Grécia reagiram, na Rússia manifestam-se contra Putin, os latino-americanos mudaram o seu subcontinente na última década ao escolher presidentes que lutam contra a ditadura das grandes empresas. Dez países, todos eles liderados por ditadores brutais durante grande parte da minha vida, têm agora líderes democraticamente eleitos com uma forte atitude contra a exploração. Por isso encorajo as pessoas de Portugal a lutar pela sua paz, a participar no seu futuro e a compreender que estão a ser enganadas. O vosso país está a ser saqueado por barões ladrões, tal como os EUA e grande parte do mundo foi roubado. E nós, as pessoas de todo o mundo, temos de nos revoltar contra os seus interesses. E esta revolução não exige violência armada, como as revoluções anteriores, porque não estamos a lutar contra os governos mas contra as empresas. E precisamos de entender que são muito dependentes de nós, são vulneráveis, e apenas existem e prosperam porque nós lhes compramos os seus produtos e serviços. Assim, quando nos manifestamos contra elas, quando as boicotamos, quando nos recusamos a comprar os seus produtos e enviamos emails a exigir-lhes que mudem e se tornem mais responsáveis em termos sociais e ambientais, isso tem um enorme impacto. E podemos mudar o mundo com estas atitudes e de uma forma relativamente pacífica.»

in jornal i

Fala José Pacheco Pereira

«Portugal comprou esta semana a bala da sua execução, com alguma pompa, circunstância e uma gigantesca cegueira e subserviência aos poderosos da Europa. Refiro-me à assinatura do texto do novo "tratado" cisionista da UE, que deixa de fora o Reino Unido e a República Checa. A assinatura por si só não significa a ratificação do tratado, que tem que ir aos Governos, aos Parlamentos nacionais, passar nos tribunais constitucionais onde é caso disso, e, no caso irlandês, a referendo. Mas conhecendo os nossos costumes, para Portugal, é como se já fosse de pedra e cal, perante a subserviência de Governo, do PSD e do PS, a complacência presidencial, o olhar para o lado do Tribunal Constitucional, e a abulia da opinião pública. Mais uma vez, fomos colocados sob o signo da nova lei da inevitabilidade, para aprovar a "regra de ouro", de que é feita a bala que, destruindo tecido, osso e massa encefálica, deu a outros o instrumento para a nossa execução.

(...)

Há receitas by the book que os bons técnicos conhecem, mas duvido que percebam por que razão os países não podem ser governados by the book. Duvido que saibam o que é o "ruído" de que sociólogos como Weber teorizaram. É que se os países fossem governados by the book, seria fácil governá-los e nada falhava. É aliás esse o mito tecnocrático, o de que o saber puro, uma espécie de matemática de soluções interligadas, de modelos, quando aplicadas com rigor, dão os resultados pretendidos. Esta é, aliás, uma ilusão muito típica dos economistas que, como agora estamos no tempo deles, arrastam atrás de si a admiração embasbacada dos comuns mortais.

Talvez valha a pena lembrar que a maioria dos modelos que foram aplicados à economia mundial e nacional falhou estrondosamente e que na génese de muitos problemas actuais está uma coligação muito próxima de economistas e políticos, ambos unidos por essa redução da política ao "economês". (...)

O pequeno e imenso problema é o "ruído" do mundo. As acções humanas, sejam na economia, na sociedade, na cultura, na política, estão cheias de "ruído", que gera um enorme fosso entre as intenções proclamadas e os resultados obtidos. Quase que se pode dizer que a regra é os resultados serem muito diferentes das intenções. É a regra que Weber lembrava aos políticos de que a maioria das suas acções tem resultados exactamente opostos ao pretendido. Aplica-se também aos economistas a fazer política.

(...)

Os propagandistas do actual poder (...) têm-se em tão alta noção de si próprios que acham que estão a "mudar Portugal", a "fazer um país diferente", um típico revolucionarismo messiânico, em versão chã.»

in Público, 3MAR2012

01 março 2012

Da leitura: uma deriva

Ler é uma experiência intoxicante. Reler e ser surpreendido é algo tão intenso que se correm certos riscos.
Há quem leia para passar o tempo. Há quem leia por obrigação. Há quem não leia por opção, preguiça, falta de preparação. Há quem o faça com o mesmo princípio com que se ouvem ritmos fáceis, para entreter.
Ler e sair-se do mundo de certezas que se possui; ler e ver-se desassossegado é verdadeiramente viciante. Como uma droga. Ler é um vício caro. Porque exige ócio. Por isso, ler assim é algo que se abeira da insubordinação. Chega a ser associal e profundamente contra o negócio.
Ler num mundo todo ele virado para o negócio é criminoso. Um estado que "promove" a leitura é um estado infantil. Ler devora tudo. É anti-estatal.
Que ainda haja 300 leitores é qualquer coisa de extraordinário, mesmo que o universo seja de 8 milhões. Trezentos leitores são demasiados para um universo concentracionário.
E no entanto há mais de 300 leitores. Paradoxos que confirmam a impossibilidade de estabelecer qualquer programa de leitura.
A mim apetece-me dizer leiam e se quiser fotocopiem, fotografem, digitalizem os livros de Joaquim Manuel Magalhães anteriores a Um Toldo Vermelho. A este guardem-no numa vitrina e prestem-lhe a mesma cerimónia que se presta a um santo: ignorem-no. A ignorância é um modo de ler. E como dizia Álvaro Lapa, lendo descobre-se.

28 fevereiro 2012

Enquanto uns trabalham outros governam-se

As dívidas globais dos municípios e das empresas municipais são de cerca de 10 mil milhões de euros, 8,2 mil milhões relativas às dívidas dos municípios e 1,8 mil milhões de euros relativos ao sector empresarial local.
Os municípios precisam na globalidade de cerca de dois mil milhões de euros para pagar as suas dívidas de curto prazo.
Os municípios tendem a fazer previsões de receitas exageradas e não conseguem arrecadar o que previam, fazendo com que haja um aumento global da dívida.
Há municípios com uma boa gestão, que têm dívidas muito reduzidas e insignificantes, como é o caso de Almada, da Amadora, de Vila Franca de Xira. Porque será?

Trabalharemos com determinação

Fala Vítor Gaspar:

"Em 2013 já estaremos em período de recuperação económica". "Trabalharemos com determinação".
O desemprego continuará a crescer ainda em 2012 e no principio de 2013. A taxa atingirá 14,5% em 2012, diminuindo para pouco menos de 14% em 2013". "Trabalharemos com determinação".
"Não pediremos nem mais dinheiro, nem mais tempo". "Trabalharemos com determinação".


E assim, com tanta determinação, Portugal é um caso de sucesso. O desemprego sobe. A recessão agrava-se. As desigualdades sociais agravam-se. O assistencialismo regressa. As pessoas vão de mal a pior, com excepção de meia dúzia que continua a viver muito acima da média nacional. E ouvimos um discurso que traz ecos perniciosos: trabalharemos com determinação. Música que encanta tantos ouvidos tugas, quiçá por um saudosismo do velho Arbeit macht frei (o trabalho liberta).

Mimos de inverno com bolas de cristal

Passos Coelho já não é tão ingénuo como parecia quando debutou como chefe do governo. Agora já tem gente a trabalhar discursos e maneiras de dizer. Há que preparar a gentalha para mais austeridade. Crêem estas luminárias que a melhor maneira é fazerem assim, dizendo que não vai ser preciso mais austeridade e completar a mensagem com uma dessas frases tão do agrado dos pacóvios salões portugueses: "Não tenho nenhuma bola de cristal. Como presidente do PSD ou como primeiro-ministro não me anuncio como um profeta". E depois insistir com uma frase longa, dessas que as pessoas logo se cansam a ler ou a ouvir: "O que posso é dizer aos portugueses que não temos, como referi ainda há poucos dias, nenhum elemento que nos leve a concluir que será necessário reajustar de tal forma o cenário macroeconómico, as perspectivas de desenvolvimento ao longo deste ano em Portugal, que isso tenha de conduzir à adopção de medidas novas que, de alguma forma, corrijam esse desempenho".

Das câmaras indiscretas

A televisão é boa quando é porta-voz dos interesses que o governo representa, mas péssima quando mostra inadvertidamente aquilo que não era suposto ver-se. Portugal ainda há pouco se ria com a postura do senhor ministro das finanças portuguesas, em tudo distinta da que tem quando dá conferências de imprensa. Víamo-lo meio encavacado, não por causa de S. Exa. o senhor Presidente da República Portuguesa mas para corresponder à enfadada generosidade de um alemão.
Agora vemos Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças de Berlim, a jogar sudoku enquanto o Parlamento discute um novo resgate à Grécia. O homem não se interessa por miudezas. Não. Um joguinho de sudoku sim, dá um bocado de adrenalina.


27 fevereiro 2012

Haja um mínimo de lucidez

Ainda bem que há vozes que dão o seu a seu dono. Como estas que põem o ponto nos is: "Há uma teia em que diversos factores, e não apenas a crise económica, podem contribuir para o aumento da criminalidade. Por exemplo, as pessoas que vêem o crime de colarinho branco a não ser punido adquirem a percepção de que se os grandes fazem, então também podem roubar num supermercado", como diz o antropólogo Daniel Seabra.
Já o inspector-chefe da PJ, Tavares Rijo, faz questão de salientar "Quando assistimos ao retirar de direitos às pessoas e vemos outros vangloriarem-se de que nem se importam muito sobre quanto vão receber por cargos não executivos (...), temo que a revolta possa surgir e que a legitimação dessa revolta se comece a instalar".
Um mínimo de bom senso é sempre salutar.

Fonte: JN

Da asneirada

O homem fala e a coisa propaga-se. Diz ele (ele é Paul Krugman) que para reconquistar competitividade, os salários em Portugal têm de descer substancialmente: 20% a 30% em relação aos salários alemães.
Ora, ou estamos completamente doidos, ou os salários em Portugal são 35% inferiores em média ao dos alemães. O salário médio anual de Portugal antes da crise era de 12 425 euros. Na Alemanha era de 34 975 euros. Se não me falham as contas eram 35,5% de diferença. Agora a coisa ainda deve ser pior.
Por isso pergunta-se que pretende Paul Krugman com a boutade? Chamar a atenção para a sua argúcia? Ou dizer que influencia o governo português? Ou será que advoga sem ter coragem para o fazer que Portugal deve ser como a China e ter trabalho escravo?
Em Maio de 2010, o economista e professor de Princeton recomendava cortes salariais que podiam ir até 30%, dando como exemplos a Grécia, Espanha, Portugal, Lituânia e Estónia. Agora fica-se pelos 20%. Curiosamente, afirma “o que se passa na Europa e no mundo se deve em grande parte ao fracasso dos economistas”. Ele deve ser um dos tais, digo eu.

25 fevereiro 2012

Da poesia















Há mais poesia numa câmara fotográfica do que em muito texto pretensamente poético. Veja-se o sítio de Jon Rafman, artista canadiano que fez algo tão simples como reunir algumas imagens do Google Street View. A força das imagens não trabalhadas, a crueza, ironia, ternura ou a mera simplicidade dos apanhados alcançam a melhor poesia e configuram mesmo um tratado da poesia hoje.

24 fevereiro 2012

Da falta de cultura política dos portugueses

A incompetência para governar Portugal é tripartida: PSD, CDS-PP e PS. São os partidos do arco governativo. São os responsáveis pelos anos de governação democrática que temos pós-25 de abril.
A crise não tem a ver com o nosso país, embora tenhamos descurado certas mudanças dolorosas. Mudanças que as grandes empresas sempre impediram, pois bastava que as tivessem exigido para terem sido feitas. E como já aqui se mostrou algumas continuam a travá-las, pois os lucros que obtêm anualmente são astronómicos.
O problema é que quem tem as mãos metidas na merda não se livra do cheiro e por isso atiram culpas uns para cima dos outros enquanto os negócios continuam a desenrolar-se em grande estilo, mesmo que pontualmente com menos lucro.
Isso que parece tão óbvio continua a não entrar nas cabeças duras de muito escriba. O ódio a Sócrates e a demonização do seu governo permanecem politicamente rentáveis. Mas socialmente criminosos, pois somos nós, os que não somos nem grandes empresários, nem gestores, nem banqueiros quem paga todas as facturas.
E das duas uma, ou somos completamente idiotas ou profundamente masoquistas, pois em vez de dizermos NÃO, rosna-se contra o governo anterior. Ou seja, demonstramos que somos, também, co-responsáveis pelo problema.

Sem comentários

«Em 2011, o valor das multas do Código da Estrada passadas em Portugal ascendeu a 85,3 milhões de euros. Trata-se de um valor superior em quase 80% relativamente ao contabilizado um ano antes (47,7 milhões). Em Janeiro deste ano, embora sem confirmação oficial por parte da Direcção-Geral do Orçamento, os montantes pagos, face ao mesmo mês de 2011, sofreram um acréscimo a rondar os 80%.»

A crise cá e noutros lados

Portugal está no grupo de países com maiores desigualdades em termos de rendimento disponível das famílias, sendo o terceiro com maior desigualdade em rendimento de trabalhadores a tempo inteiro, diz a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. (fonte)
Entre os 17 países do euro, os quatro países do Sul - Portugal, Grécia, Espanha e Itália - que estão a realizar maiores esforços de consolidação orçamental são precisamente aqueles que enfrentam um panorama mais negro. Todos estarão este ano em recessão, o que já era esperado para Portugal e Grécia, que terão um crescimento de menos 3,3 e menos 4,4%, respectivamente. A surpresa surge em Espanha e Itália, cujo PIB sofrerá uma contracção de 1 e 1,3%, respectivamente, contra uma progressão de 0,7 e 0,1% esperada há três meses. (fonte)
A receita aplicada, como se ouve repetir até à náusea, é boa. Para quem? Segundo o jornalista e investigador espanhol Santiago Camacho, autor do livro "A Troika e os 40 Ladrões", "Os Estados como Portugal, Grécia, Itália e Espanha têm dívidas, mas uma boa parte dos défices públicos ficaria resolvido se não fossem as enormes fraudes cometidas por empresas que estão a pagar muito menos impostos do que aquilo que deveriam de facto pagar porque utilizam mecanismos de engenharia financeira através da banca offshore". Já "em Espanha, as empresas que fazem parte do índice bolsista estão a descontar em impostos uma quantidade ínfima em relação aquilo que deveriam pagar porque utilizam filiais nas ilhas Marshall, no Lichtenstein, nas ilhas Caimão e que ficam com todo o dinheiro. Se a fraude e a evasão fiscais dessas empresas fosse combatida em Espanha, na Grécia e em Portugal o défice seria anulado".
Camacho advoga que está na hora de "os países que estão a ser atacados pela crise dizerem que estas medidas não servem de nada e que é preciso repensar a economia desde o ponto de vista do interesse dos cidadãos e não em benefício dos bancos que foram os que nos atiraram para esta situação".
Mas para isso era preciso que a democracia funcionasse, ou seja, que as pessoas dissessem basta! Ora, a democracia precisa de partidos e os do arco de poder estão reféns da banca e de instituições afins.

23 fevereiro 2012

Case study: como criar emprego

Portugal é um país inovador, moderno, criativo. Tem no governo palhaços que tentam animar o povo com piadas de alto gabarito. Ora riam-se lá:
Pedro Martins convocou a imprensa para falar do Programa de Relançamento do Serviço Público de Emprego, hoje aprovado em Conselho de Ministros, dizendo que o Governo pretende reconverter em gestores de carreira cerca de 150 dirigentes do Instituto de Emprego e Formação Profissional. "Vamos proceder a uma nova configuração de tarefas dos técnicos de emprego, de modo a que os cerca de 1.000 técnicos de emprego do país passem a gestores de carreira, com maior proximidade aos desempregados de modo a ajudá-los a regressar mais rapidamente ao mercado de trabalho", disse aos jornalistas o secretário de Estado do Emprego.
É de partir o coco.

Diz-se e desdiz-se

Os "responsáveis" governamentais portugueses ou de instituições europeias mentem com quantos dentes têm na boca. Veja-se o caso do presidente do Banco Central Europeu (BCE) que considera que o programa de Portugal "está no bom caminho" e que o País não precisa de mais ajuda financeira. Mario Draghi considera que o país está a implementar "medidas apropriadas", com "objectivos alcançáveis e realistas". (fonte)
Já Silva Lopes garante que Portugal vai precisar de auxílio adicional. Mal de nós se ela [ajuda] não for dada". (fonte)
Poderíamos referir outras vozes. É um espectáculo. Vítor Gaspar agradece ao alemão. O alemão, qual magnata, diz de forma displicente que o seu país considerará nova ajuda ao nosso país.
Robert Mundell, Nobel da Economia e também considerado "pai do euro", afirma que Portugal vai precisar de novo resgate devido à recessão (fonte). E toda a gente sabe que sim, que é verdade. Mas continua-se a fazer de conta e a assobiar para o lado, para dar ideia de que os gestores de desempregados são a melhor das coisas que vamos ter e que os mercados são muito sensíveis a estes passos de balet.

22 fevereiro 2012

Vergar? Jamais. Só aos ricos, sejam donde for

O governo em funções é duro. Miguel Relvas é o rosto e a voz da força (será prepotência?). Pouco importa. Registe-se a convicção com que diz: não há tolerância de ponto no Carnaval em 2013.
Faz tudo parte de uma estratégia. Qual? Ainda não percebeu? A de chatear a populaça e mostrar quem manda. Em Espanha já andam à bordoada nos estudantes. Aqui não há-de tardar. Força, Relvas, o governo está contigo. E o povo tuguês gosta de gente com força.
O governo em funções envergonha o país com estas estratégias de lamber as botas aos ricos e esmifrar o povo. É feito da mesma estirpe desses empresários belgas que se desfazem de funcionários mutilados para que morram aos poucos em becos sem saída.

21 fevereiro 2012

Da vaidade

«Os escritores têm muita dificuldade em aceitar que tudo acaba por se esquecer. Tudo tende para o esquecimento. Mas há mais relações, o jornalista aprende com o escritor o respeito pelas palavras, sabendo que há palavras que se dão com as outras, e outras não. Não calcula o tempo que demoro a escrever aquela merda com 1400 caracteres. Leio aquilo tantas vezes... Volto atrás e vou para a frente. Só a trabalheira de arranjar assunto. Eu espontaneamente só tenho opinião uma vez por ano, agora tenho de ter todos os dias porque ganho a vida assim.»

«Os políticos tratam-me sempre bem. São umas putas velhas.»

«Eu não tenho nenhuma fé. Mas escrevi recentemente uma crónica chamada “O que fica depois do que se perde”, sobre o filme “A Palavra”, do Dreyer. É uma história sobre a fé.»

«No outro dia disse uma coisa com que concordo, nem sempre isso me acontece. Estive a reler uma entrevista minha à “Ler”, e exclamei: “Eu disse isso?” Fiquei contente. Achei que tinha dito uma coisa acertada. Nem pareço eu. A propósito do Joaquim Manuel Magalhães falar do regresso ao real, disse: “Mas há alguma coisa que não seja real? Tudo é real. O problema é que há muitas realidades. O sonho é tão real como estar acordado.”»

palavras de Manuel António Pina em entrevista ao jornal i

O Estado, a ortografia e o resto

Fala António Feijó:

O Estado abstém-se de entrar em certos domínios da economia porque entende que não tem vocação para o fazer. Então porque é que há-de entrar nas consoantes mudas? É um contra-senso.

Um governo ter legitimidade democrática não significa que tem legitimidade de legislar em todas as áreas. Há uma série de funções que seria abusivo o Estado arrogar-se exercer. A imposição de uma ortografia é uma delas.

A noção de educação deixou de interessar. A brutalidade prática é tal, que a única coisa que interessa é a saída profissional. E isto é algo que vai ter custos enormes no país, nem que sejam custos de um ponto de vista moral, da auto-estima das pessoas, etc.

(...) a questão central é a educação das pessoas, o que é que determinada pessoa é capaz de fazer, se é capaz de articular um pensamento lógico, perceber um argumento, escrever um texto. Nada disto interessa, interessa apenas que tenha uma saída profissional. E quando depois vamos ver os índices de desemprego, reparamos que cursos que tinham emprego pleno, como por exemplo Direito, deixaram de ter (...)

(...) falamos com os maiores empregadores portugueses e dizem--nos: “As pessoas aprendem no exercício da actividade, na empresa. Queremos é pessoas que saibam pensar, exprimir-se, que saibam perceber a leitura de um texto complexo. Desses é que nós precisamos, depois cá dentro é que os treinamos, não precisamos que vocês os treinem para trabalhar, por exemplo, na Portugal Telecom, pois a Portugal Telecom é que vai treiná-los para trabalhar na Portugal Telecom”.

20 fevereiro 2012

Da democracia e do dinheiro

Os governos cortam e onde se notam logo os cortes é nos salários e no emprego. O emprego cai, os salários das maiorias baixam e os mercados sorriem de satisfação. Ao desemprego junta-se a exclusão social, o aumento das desigualdades e da pobreza, a rotina da humilhação, o desmembramento da dignidade humana (isso em que supostamente assentam as constituições de todos os países europeus). A hierarquia de valores inverteu-se e o dinheiro sobrepõe-se à vida das pessoas. Podem morrer milhares, isso são migalhas num negócio de biliões.
Wolfgang Munchau, colunista do "Financial Times", acusa a Alemanha de ter tentado que a Grécia adiasse as eleições e permanecesse com o Governo liderado por Lucas Papademos. Mas as acusações não ficam por este ponto. O colunista diz mesmo que “a estratégia da Alemanha parece ser fazer a vida tão miserável que os próprios gregos vão querer sair da Zona Euro.” “É uma estratégia de suicídio assistido” e “extremamente perigosa e irresponsável.”

Da banca e da política. Quem manda mais?

A resposta é óbvia? Não, não é. O que acontece é que os ministros da economia e das finanças sabem que a vida não acaba no governo...
Veja-se: Sócrates lutou até ao fim para que não houvesse pedido de ajuda. A banca fez o inverso. Ouça-se Judite de Sousa: “Muitas pessoas não perceberam porque é que andava a entrevistar banqueiros todos os dias. A verdade é que as entrevistas foram feitas numa segunda, numa terça, numa quarta e numa quinta; 48 horas depois, o primeiro-ministro estava a pedir ajuda financeira.” “Acabei por, com aquelas entrevistas, fazer parte de uma narrativa que foi meticulosamente preparada pelos banqueiros para acertar uma posição conjunta de forma a fazer um ultimato a José Sócrates.”
Por onde partiu a corda? Pelo lado de Teixeira dos Santos. Este sabia que Portugal não tinha força nem dinheiro para aguentar o braço de ferro com os mercados e com a banca.
A banca, como também já se percebeu, não cumpre a função de financiar a economia, mas os gestores ganham como reis. A banca é grande. Os portugueses são pobres... de espírito.
Quem acredita na troika ganha pouco e mal. Quem cumpre a missão de dourar a pílula da troika ganha muito acima da média dos portugueses e precisa de manter o seu nível de vida.

Da fé

Em Portugal a crença é universal. O povo acredita nos pastorinhos, o governo em Portugal. É um mar de crença, tanto azul, tanto branco.
E que tem o primeiro-ministro a dizer? Ora, coisas tão profundas como qualquer palerma num café: «Não podemos andar a varrer os problemas para debaixo do tapete e fazer de conta que as dificuldades não são muitas. Parceria de tolos.»
Portanto, só falta acrescentar que Passos Coelho enche a boca com afirmações destas: «Não tenho uma mensagem mais forte para Portugal hoje, que não seja a de dizer: eu acredito no meu país, eu acredito na Europa».
Olé!

Das dívidas

A dívida conjunta de Estado, famílias e empresas não financeiras ascendeu, no final do ano, a 715 mil milhões de euros, ou seja, 418% do PIB.

Fonte

A grande banca portuguesa

... houve um período em que os bancos emprestavam para tudo, a taxas baixas, ficando garantidos com a hipoteca do imóvel e com fiadores – na maioria, os pais –, mesmo sabendo que os seus rendimentos eram baixos. Resultado: há cada vez mais casos de idosos que, por terem avalizado os empréstimos dos filhos, vêem os seus imóveis serem penhorados.

frases retiradas daqui

Pequenas coisas sem importância. Portugal

Fala Pedro Santos Guerreiro:

«Mesmo com abundância de liquidez e de crédito, a economia não cresceu - cresceram as margens de lucro de alguns grupos [EDP, PT, Galp, Mota-Engil, Brisa, Sonae, Jerónimo Martins], muitos deles protegidos. Agora que o Governo já tratou das leis laborais e os mercados trataram do mau (e do bom) financiamento público, falta abrir os aloquetes dos cintos de castidade aos protegidos.»

«Enfrentar uma vaia em Gouveia é nada ao pé desses silenciosos lóbis. É mais fácil não ter medo do povo que do polvo.»

«A derrapagem no sector dos transportes é maior que os salários que a função pública perde. É preciso dizer mais?»

Pequenas coisas sem importância

Independência é uma palavra redonda, cheia de ondulações, musical. E também rica de sentido. Segundo o dicionário Houaiss, tomo IV, pág. 2078, é o estado, condição, carácter daquele que goza de autonomia, de liberdade em relação a alguém ou alguma coisa.
Ora, como nos vêm ensinando muitos autores, desde antiguidade, passando pelo século XVII e seguintes, é uma fantasia a que alguns se entregam e que costumam pagar com a vida.
O mundo de hoje, tão informativo, é um mundo cheio de independentes. A informação é independente, mas em dando-se o caso de ser indiscreta pode-lhe acontecer como a António Galvão (o repórter de imagem da TVI que captou a polémica conversa a 9 deste mês, entre Vítor Gaspar e Wolfgang Schäuble), que passa a estar impedido de aceder à sala onde se reúnem os ministros da União Europeia, pelos serviços de imprensa.
Noutra parte do globo, esse lídimo representante do povo russo (que é apelidado nas ruas de aldrabão e de vigarista) chamado Vladimir Putin tem a vitória assegurada na primeira volta das eleições presidenciais. Ele sabe como ninguém que teclas tocar para pôr os russos a dançar ao som da sua orquestra. E já prometeu um rearmamento “sem precedentes” da Rússia. Ah o orgulho russo. Ah o mundo belo em que vivemos, a caminhar contente e tranquilo para um regresso em força das ditaduras, em nome do enriquecimento da meia dúzia do costume, e num tempo supostamente de informação.

16 fevereiro 2012

Já são mais de um milhão

os cidadãos portugueses que não têm emprego. Ao todo dá o lindo número de um milhão e 57 mil portugueses.
Os 770 mil de que fala o Instituto Nacional de Estatística (INE) esquece os 203 mil inactivos disponíveis e os 83 mil inactivos desencorajados, a que é preciso juntar ainda os 286 mil que, apesar não terem emprego, também não procuraram trabalho activamente.

Da poesia. Uma irritação

A poesia é um assunto tóxico. Por favor não metam a poesia onde não é chamada. E aqueles que se entusiasmam com as baboseiras e fantochadas do costume tenham pelo menos a decência de deixar a poesia em paz. A poesia passa bem sem essa tanta gentalha que mal sabe ler, que quase nada lê e que agita as coberturas acrílicas com chilreios irritantes.
A poesia é vida e a vida cheira mal. A vida não usa perfume, nem anda de BMW. A poesia diz, sugere, brinca, irrita, seduz e permite o uso de tantas outras acções porque (refrão) é vida, tem sangue, fezes, emoções. As emoções são perigosas, podem levar as pessoas para lá do que é devido. A poesia é perigosa. Tão perigosa que, excepto uns poucos, continuam a etiquetá-la junto aos cosméticos ou junto aos rolos coloridos de papel higiénico. As etiquetas sempre foram úteis, sempre permitiram aos burocratas orientarem-se e dominar. Mas a poesia é vida, não se submete a nenhum credo. De vez em quando fere. Às vezes chateia. Mais raramente ousa. E todas as ousadias são um remendo. A poesia é vida, não é um rol de palavreado cheio de referências e citações. Quando espirro, quando tusso não estou preocupado com Shakespeare ou com Camões. A poesia pode ser um catarro medonho. Ou o mau cheiro de quem bebe mais do que a conta.
A poesia não é coisa de professores, sejam básicos ou universitários, embora uns e outros gostem muito de se lembrar dela no dia mundial da coisa. Ai, a poesia... Ou a poesia e tal e coisa, aquelas palavras que se encavalitam umas nas outras e fazem momices com os braços como as medíocres representações teatrais. Não, a poesia tem fome, tem sede, anseia, quer. A poesia é vida ou não presta. A vida não se limita ao bê-a-bá da economia ou disto ou daquilo. É, como sempre foi, um campo vasto de possibilidades que o homem tenta abarcar mas que lhe continua a escapar. Há ainda muito por conhecer. Por isso, aqueles que parafraseiam quem disse que já está tudo dito só podem estar a brincar - e a poesia, recordo, também é um jogo.
Posto isto, bardamerda para quem gosta de poesia.