Mesmo depois de uma intensa cultura televisiva (filmes, séries, documentários, debates, noticiários) a população continua a ser encantada pelas vozes que, cá e lá fora, falam como se estivessem num coro sob a batuta de um maestro comum. O encantamento é quebrado pelas vozes do contra, as quais, por serem do contra, só encontram eco em quem também é do contra, ou seja, minorias (mesmo que relativamente numerosas).
Como quebrar esse encantamento? Até agora não se conseguiu. A população resiste e permanece crente, mesmo que já saiba que os reis não recebem o poder de Deus. Ou que insista no"eles são todos iguais". A população tem o dom de apostar na igualdade, como se vê na hora certa acorrer às urnas, onde sempre premeia a igualdade. Será que quando a população se refere à igualdade apenas reclame para si própria a legitimidade da ilegalidade ou tratar-se-á de algo ainda mais refinado?
Como sou um tanto ou quanto limitado, opto pela transcrição de alguns cabeçalhos e leads dos jornais de hoje:
«Arcebispo de Braga diz que quase se engasgou com valor da reforma de Jardim Gonçalves» (jornal i) / «O arcebispo de Braga, Jorge Ortiga, confessou hoje que quase se engasgou quando esta manhã tomava o pequeno-almoço e leu que o antigo presidente do BCP, Jardim Gonçalves, recebe uma reforma de cerca de 175 mil euros.»
«Portugal arrisca pôr-se a caminho do Terceiro Mundo, diz Teodora Cardoso» / «A presidente do Conselho de Finanças Públicas, Teodora Cardoso, considera que a política de cortes salariais aconselhada pela troika e seguida pelo Governo pode pôr Portugal a caminho do Terceiro Mundo. “Hoje em dia é praticamente impossível um país desenvolvido, como, apesar de tudo, nós somos, andar a competir com os países muito mais pobres do que nós, com níveis de rendimento e, portanto, de salários muitíssimo baixos”, sustentou numa entrevista à Antena 1. “Se o nosso nível de competitividade quer ir para esse lado, isso significa que, então, nós nos estamos a candidatar a passar para o Terceiro Mundo, se não para o quarto.”» (jornal Público)
«PCP diz que renegociação da dívida será inevitável» / «No encerramento do debate agendado pela sua bancada sobre a renegociação da dívida, o líder parlamentar comunista, Bernardino Soares, afirmou que "a alternativa que está em discussão não é renegociar ou não renegociar, é renegociar agora com algumas condições ou renegociar depois". "Não há alternativa à renegociação, a opção é termos uma palavra a dizer agora ou não termos uma palavra a dizer e esta ser-nos imposta de forma abrupta", declarou, rejeitando as acusações da maioria de que renegociar significa "não pagar". O deputado do PCP sublinhou que renegociar "é rever os prazos, as taxas de juro e eliminar a dívida ilegítima. Há juros agiotas e especulativos têm de ser julgados e condenados"» (TSF).
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