06 abril 2008

Para quem não tem medo de ler em castelhano


«Não sei se na poesia é necessário que haja ideias. Sei que, em muitos casos, nos poetas de verso fácil não há nenhuma. Tão pouco naqueles que não têm o mínimo sentido da forma, sequer o mínimo sentido da prosa. Se vem tudo de uma vez, para quê pensar? O poeta, se crê nalguma coisa, crê nisso, em que é poeta e que, portanto, qualquer coisa que faça legitima-se a si mesmo por essa condição que o poeta a si mesmo se concede. Entre os que não são de verso fácil, há de tudo. Por exemplo, poetas curiosos e aborrecidos, que tão pouco têm alguma ideia, e poetas cómicos, que, forçados pela forma, acabam a dizer qualquer coisa menos a sua ideia. E há também poetas que, por esse milagre multiplicador que é o encontro entre as ideias que o são e o verso que as impõe, não só nos dizem o que a princípio nos queriam dizer, mas muito mais; não só nos mostram a direcção correcta dessas ideias, como a infinidade de inesperados e estranhos caminhos que, aparentemente, se desviam dele, se entrecruzam ou o rodeiam; caminhos que, orientados pela sua luta com o verso, se vêm obrigados a transitar; caminhos altos de montanha, que, noutras circunstâncias, não teriam frequentado e que se abrem a perspectivas desconhecidas. No final, estes poetas oferecem-nos um mapa rico e complexo das suas almas, da orografia e dos percursos das suas almas. A mim agradam-me esses mapas, os mapas detalhados.»

Julio Martínez Mesanza

Poeta e tradutor espanhol (Madrid, 1955). Traduziu, entre outros, Vida Nueva de Dante e publicou livros em 1983, 1986, 1988 y 1990, sempre com o mesmo título Europa. Em 1996 saiu Trincheras e, dois anos depois, Fragmentos de Europa 1977-1997. Em 2007 publicou Entre el muro y el foso, ano em que saiu também a antologia Soy en mayo com poemas dos livros anteriores. Tem um blogue, Cuestiones naturales, donde retirámos o texto.



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