31 maio 2009

Ainda os salários ou o "mileurismo" ou o babyloser


No El País de hoje vem um longo artigo sobre o fim da classe média e o crescente número de gente que tem de viver com mil euros por mês ou até menos, em países onde essa massa salarial representa pauperização. Estão nessa situação jovens universitários recém licenciados, operários qualificados, desempregados de longa duração, imigrantes, quarentões que perderam empregos e até gente com idade provecta mas ainda não incluídos na idade da reforma. Em Espanha estima-se que sejam já 12 milhões. França, Grécia, Alemanha, EUA também possuem muita gente nessas condições. Portugal não é referido, mas sabemos que há muita gente a recibos verdes e muito licenciado desempregado.
O jornal refere que apesar da riqueza criada entre 1995 e 2006, a mesma não contribuiu para o aumento dos salários mas para o aumento dos lucros dos que já eram ricos.
Segundo os autores do livro El fin de la clase media y el nacimiento de la sociedad de bajo coste (Massimo Gaggi e Eduardo Narduzzi) "A classe média era accionista do financiamento do Estado de bem-estar, e o seu desaparecimento implica a crise do welfare state, porque à [nova] classe de massa já não lhe interessam impostos elevados como contrapartida politica para com a classe operária, que em grande parte foi também absorvida pela classe de massa. A nova sociedade é menos estável e potencialmente mais atraída pelos alarmes políticos reaccionários, capazes de trocar maior bem-estar por menos democracia. Também é uma sociedade sem uma identidade clara de valores, por isso é oportunista, consumista e sem projectos a longo prazo".
Os riscos são elevados: perda de qualidade de vida, fim das conquistas sociais e laborais que levaram a séculos a conquistar, generalização da política-espectáculo (de que Berlusconi e Sarcozy são já bons exemplos, dando-se mais atenção aos seus casos amorosos do que às políticas que põem em prática).

Estilística da língua portuguesa

Os diminutivos são geralmente usados como descarga sentimental, traduzindo uma manifestação que pode ser tanto de afecto como de aversão por pessoas ou coisas. Talvez porque sempre fomos sentimentais e escarnecedores e os sufixos captam bem essa dupla e contraditória faceta do nosso temperamento, às vezes de grande delicadeza lírica, às vezes ostensivamente galhofeiro e motejador.
O diminutivo inho é, dentre os sufixos, aquele que mais absorveu essa característica temperamental do ser português, associando a pequenez a algo ternurento, simpático, gracioso (pobrezinho, mãezinha, paizinho, velhinho), pois, como em tempos disse Jaime Cortesão, o português é uma língua lírica, franciscana, repassada de ternura e de piedade e por isso muito rica em diminutivos caridosos. No entanto, como assinalou Rodrigues Lapa, somos, porém, gente apaixonada, e facilmente vamos de um extremo ao outro, pelo que não é de surpreender que o mesmo sufixo evoque em nós sentimentos depreciativos.

Transcrevemos dois sonetos, um do ferino Bocage, outro do sofrido António Nobre, que fazem distinto uso do diminutivo. Os exemplos foram colhidos nesse livro magistral de Lapa que é Estilística da Língua Portuguesa. Esperamos que contribuam para um bom domingo de quantos aqui vêm.



Junto ao Tejo, entre os tenros Amorinhos,
as belmíricas musas pequeninas,
para agradar a estúpidas meninas
haviam fabricado uns bonequinhos.

Com eles os travessos rapazinhos,
que são mui folgazões e mui traquinas,
armaram mil subtis alicantinas
e os lançaram depois nuns bispotinhos.

Eis tágide louçã, de ebúrneo colo,
a quem não vencerá, por mais que lute,
o nosso Belmirinho, anão de Apolo,

Surge d'água e lhe diz: – Filhinho, escute,
olhe com que notícia hoje o consolo:
é poeta do rei de Lilipute!




Fazes-me pena, ao ver-te. Andas rotinho,
como que envolto em transparente véu:
pouco me falta para te ver nuzinho,
pouco te falta para andar ao léu!

Tens a batina, pálido Misquinho,
cor da esperança... e tem a cor do breu...
No entanto assim foi Cristo, em rapazinho,
e hoje é o duque de Morny no céu!

Por isso, ó flor ideal dos rapazitos,
paciênciazinha, cose os farrapitos
dessa batina. Toma a agulha e as linhas.

Dar-te-ia, crê, meu lindo pequerrucho,
uma das penas orientais – um luxo! –
se eu fosse Deus, o pai das andorinhas.

30 maio 2009

O populismo da candidata do PCP


Os salários elevados são um direito, embora isso possa soar mal aos ouvidos da populaça. E a mim desagrada-me que uma deputada comunista venha acenar com causas que são recorrentes em partidos populistas como o CDS-PP. Se não é aflição é outra coisa pior.
Os deputados devem ter um salário digno, para que possam exercer a sua actividade de representantes do povo livremente, mesmo que falar disto seja correr o risco da pura ficção. Já que eles quase sempre representam interesses particulares do partido ou de outras clientelas. A senhora Ilda Figueiredo é um bom exemplo disso.
A crise de que fala enferma ou da falta de ideias ou do medo de a votação do PC diminuir drasticamente (à medida que os velhos comunistas vão morrendo, o PC perde base de apoio). Há muito para fazer na Europa, ao nível salarial e a outros níveis. E disso deveria falar. Por pedagogia e em nome da ideologia que parece ser a sua, mas não. Sendo assim, porque não opta por receber o salário mínimo nacional?

Fala quem sabe


Excertos da entrevista de José Gil ao Público:

Há sempre na aprendizagem aquilo que se chamava antigamente na filosofia, e hoje também, a intuição. A intuição é fundamental porque se aprende à sua maneira. Não é um dado formal, universal, que se possa definir da mesma maneira para todos.

P - Não se pode comparar, quantificar?

JG - Não. O que se põe agora nos parâmetros e critérios de avaliação, que se multiplicaram, é uma espécie de factores analisados, decompostos, daquilo que era o terreno da intuição. Por exemplo, mede-se a criatividade. Ora a criatividade o que é? O que é a produção do novo? Como é que se inventa? Quais são os processos de invenção?
Como sabemos, na ciência, a invenção está muitas vezes fora da escolaridade, do ensino, das regras. São as pessoas um bocado desviantes que fazem as maiores descobertas e depois tornam-se Nóbeis, etc. Isto tudo é abolido pelo controlo da avaliação. Quer dizer vai-se abolir a singularidade, a capacidade de inovação, porque se integra este terreno da intuição numa aferição da performance, do desempenho, que é quantificável.

(...) como não se pode avaliar isso, as pessoas que vão ser submetidas a essa avaliação vão ser homogeneizadas, o que conduz à morte da singularidade.

P - As utopias políticas do século passado anunciaram um “homem novo”. A avaliação, como a descreve, aponta para um homem com uma postura de subordinação. Qual é o objectivo que está subjacente?

JG - A formação de uma subjectividade adequada às exigências da economia da globalização, da economia que vem aí, cujo eixo principal é o capitalismo, de que nós talvez ainda nem conhecemos as formas. Mas isso parece-me evidente. E o que é mais paradoxal é que nunca se falou tanto em criatividade, em inovação como agora, quando se estão a impor os meios de um controlo para que a inovação, criatividade, desapareçam.

P - Institui-se a avaliação como meio de controlo, como relação de poder?

JG - É uma questão de controlo e uma questão de poder. Isto não vai fazer desaparecer a inovação, não vai fazer desaparecer as grandes descobertas científicas. O que vai fazer é criar um hiato, uma separação cada vez maior. Vai haver uma elite hipercientífica, filosófica não sabe, hiperespecializada, e essa sim poderá inovar.
Para os outros estamos a multiplicar os parâmetros de avaliação, absorvendo essa margem de indeterminação num espaço de controlo cada vez maior. E com isso estamos a acabar precisamente com a experimentação interior, o erro possível, a liberdade interior que é possível e necessária à criação.

(...) É preciso que o professor tenha uma autoridade espontânea. E idealmente não tenha que a exercer. A relação antiga do mestre e discípulo na Renascença, por exemplo, é essa. Não é uma relação de poder.
(...)
Posso dizer, toda a gente pode dizer, que um dos efeitos da politica do Ministério da Educação foi virar todos contra todos. Virou-se os alunos contra os professores.

(...)
P– No seu entender, qual é o objectivo deste modelo de avaliação?

JG - Em Portugal havia uma espada de Damocles sobre o Ministério, todos os Ministérios, que é o dinheiro. Por outro lado, há um problema real de que os sindicatos não falam.
A nossa escola não estava boa. Muitos professores, ou pelo menos uma parte deles, não têm qualificações. Com a avaliação, alegadamente, matavam-se dois coelhos: reduziam-se as despesas, reduzindo o pessoal, e punha-se fora os que não eram bons.
Mas o que é que aconteceu?. Muitos dos que eram bons é que saíram. Saíram porquê? Não aguentam. E o que é que eles não aguentam? Não aguentam não poder ensinar, não aguentam não poder ter uma relação em que precisamente se construa um grupo em que o professor age, em que se aprende ensinando, em que os alunos querem.
Tem que haver avaliação. Não pode é haver a inversão da subordinação da avaliação porque agora se estuda para se ser avaliado. Veja as Novas Oportunidades, para que é que serve?

P- Para fornecer um diploma?

JG- É o chico-espertismo que entrou na escola. Vamos não trabalhar para obter um diploma.

P- No seu livro alega que há como que um objectivo maior. Conjugando as políticas e omodo como o Ministério reagiu à contestação dos professores, está-se perante uma estratégia de domesticação?

JG- Isso parece-me evidente. É um projecto maior, que talvez não seja muito consciente na cabeça dos nossos dirigentes e, em particular, na do primeiro-ministro José Sócrates.
A ideia intuitiva, ele ainda tem intuições, é a de que o autoritarismo é um método económico. Resolvem-se mil coisas. Há essa ideia: funciona ser autoritário. Uma vez vendo que funciona, vamos estender. Os portugueses querem um certo autoritarismo, nós tomos, que estamos desnorteados, perdidos. O autoritarismo é um meio de governo. (...) E como não há quase resposta a este autoritarismo, ele rebate-se, plasma-se, na realidade.

P - Ficámos com uma escola pior?

JG - Arriscamo-nos a isso. A escola já não era boa. A escola precisa de reformas, é necessário pensar uma avaliação, mas para pensar uma avaliação temos primeiro que pensar em conteúdos. A primeira das coisas a fazer é revalorizar os professores, agora. A relação geral dos alunos relativamente ao saber é de rejeição. A ideia do professor como alguém que abre as portas para o mundo acabou ou está em vias de acabar. Isto tem de ser restaurado.
Depois tem que se parar com a avaliação multiplicada a todo o instante. Estamos sempre a comparar-nos. O mal desta avaliação é que ela compara e a competitividade, a rivalidade, que existem numa escola, que são necessárias para a aprendizagem, torna-se inveja.

Jogos e outras aventuras


Dinheiro fácil é o sonho do povo, mesmo que seja povo que se faz transportar em viaturas de gama alta. Há um jogo, a que chamam jogo da bolha, que funciona em pirâmide, ou seja, precisa que haja jogadores novos a chegar com dinheiro fresco para que os mais antigos possam ir ganhando grandes quantias dinheiro. Aos neófitos é pedido que percam 2 mil euros, para que, meses depois, se o jogo continuar, possam arrebanhar 10 vezes esse montante ou até mais.
O esquema funciona como um bolo fatiado. Cada fatia de cada círculo corresponde a uma posição mais distante ou menos do centro onde está o dinheiro. Só se entra com dinheiro no primeiro anel da bolha, que está dividido em oito partes. Quando estas estiverem preenchidas por novos membros, poderão subir ao segundo e depois ao terceiro círculo até serem empurrados para o centro da bolha.
Para continuar o jogo é preciso angariar novos participantes, por isso os convites são peça chave do jogo. Os locais variam e as reuniões são marcadas com meia hora de antecedência por sms ou através de outras formas.
Num desses encontros, em Vila Nova de Gaia, foram os convivas surpreendidos por visitas policiais: três indivíduos, de farda e encapuzados, munidos de metralhadoras e caçadeira, surpreenderam cerca de 800 pessoas numa quinta, informaram-nas de que era um assalto, retiraram-lhes o dinheiro, criaram um cenário de tensão, desejaram "boa noite e bom jantar" aos participantes e as vítimas não se queixaram às autoridades.
Reparem: "Vestidos de polícias, encapuzados, com metralhadoras e caçadeira, três indivíduos surpreenderam cerca de 800 pessoas que, anteontem à noite, participavam no "jogo da bolha", numa quinta em Gaia. Assalto pode ter rendido até um milhão de euros."
O jackpot foi para aqueles três que já deviam ter participado naquelas reuniões e foram suficientemente audazes para perpetrar o golpe (soa bem, não soa?).

Fonte: JN

29 maio 2009

Bonnie e Clyde





Viveram pouco, mas vertiginosamente. Morreram baleados e ficaram para a história como o par mais sedutor de sempre.
O filme de 1967 contribuiu para perpetuar a lenda do casal, cujos assaltos e assassínios abananaram a América dos anos 30. Que se deixou seduzir pela história de Bonnie Elizabeth Parker e Clyde Chestnut Barrow.
O percurso de ambos é um bom postal ilustrado da América dos anos de crise, e de um velho sistema judicial que penalizava os mais pobres, empurrando-os para uma violência cada vez maior. Bonnie e Clyde cedo perceberam que só podiam defender a vida com a lei da bala e usaram-na.
A fama (que não era o que procuravam) envolveu-os numa aura que ainda acelera corações e desperta interesse, o que levou o FBI a disponibilizar material sobre os bandidos.

28 maio 2009

Vargas Llosa contra Hugo Chávez


O poder não gosta de contrariedades e sempre reage mal. Em se tratando de um poder que raia a ditadura as reacções configuram abuso, prepotência, quando não a morte.
Hugo Chávez é um ditador que faz de conta que é democrata. O seu populismo, fruto do dinheiro do petróleo, permite-lhe a brincadeira, tanto mais que a maioria dos votantes venezuelanos cede, sob efeito da ébria alegria das promessas do ditador. Mas nem todos dependem de Chávez para levar a vida para a frente. E alguns nem sequer são venezuelanos, como Mario Vargas Llosa, escritor peruano
Vargas Llosa está na Venezuela para participar no Encontro Internacional Liberdade e Democracia e mal aterrou ficou retido no aeroporto, numa tentativa de o constrangerem a não falar mal do regime de Chávez. Em vez de o calarem, deram-lhe mais força e amplificaram internacionalmente as suas afirmações: "No queremos que Venezuela se convierta en una sociedad totalitaria comunista. No lo es todavía porque si lo fuera no estaríamos aquí"; "La democracia fiscaliza el poder, por eso estamos aquí para defender las democracias de mercado"; "No vengo a insultar a Chávez, a los presidentes los critico cuando me parece que hay que criticar, y lo hago con energía, pero jamás a través del insulto".

Fontes: ABC; El País

Pai e filha

La Migration Bigoudenn

27 maio 2009

De mentira em mentira até ao descalabro


Dias Loureiro demite-se no dia a seguir às declarações de Oliveira Costa. Ele diz que não foi por causa disso. Di-lo agastado, visivelmente perdedor. Há meses a pose foi bem outra.
A população há muito pensava que Dias Loureiro mentira. Mas o que a população pensa nada interessa para o bem-estar ou mal-estar das figuras em causa. Interessa-lhes sim, se vão ser ou não julgados e condenados.
Mas quanto a Dias Loureiro fica a questão: compreenderá que o que acaba de acontecer mina ainda mais a confiança que os cidadãos depositam na classe política? E que isso, nos tempos que correm, é perigoso, podendo Portugal caminhar para a berlusconização? Dias Loureiro quer ser um dos responsáveis por essa evolução?
Salvar a face é uma coisa, outra, bem diferente, é ter sido administrador-executivo da Sociedade Lusa de Negócios (SLN) entre Dezembro de 2001 e Setembro 2002 e administrador não-executivo até 2005. Ficou de contar a verdade e mentiu. Além de perjúrio, vem agora dizer que quer ser testemunha. Porque não disse o que tinha para dizer? Porque a lei o impede? Ora, ora, Manuel Dias Loureiro...

MOVIMENTO PELA IGUALDADE no acesso ao casamento civil.


O Movimento Pela Igualdade (MPI) no acesso ao casamento civil defende (e passamos a transcrever):

A igualdade no acesso ao casamento civil é uma questão de justiça que merece o apoio de todas as pessoas que se opõem à homofobia e à discriminação. Partindo da sociedade civil, a luta pelo acesso ao casamento para casais de pessoas do mesmo sexo em Portugal conta neste momento com um crescente apoio político e social. Nós, cidadãos e cidadãs que acreditamos na igualdade de direitos, de dignidade e reconhecimento para todas e todos nós, para as/os nossas/os familiares, amigas/os, e colegas, juntamos as nossas vozes para manifestarmos o nosso apoio à igualdade. Exigimos esta mudança necessária, justa e urgente porque sabemos que a actual situação de desigualdade fractura a sociedade entre pessoas incluídas e pessoas excluídas, entre pessoas privilegiadas e pessoas marginalizadas; Porque sabemos que esta alteração legal é uma questão de direitos fundamentais e humanos, e de respeito pela dignidade de todas as pessoas; Porque sabemos que é no reconhecimento pleno da vida conjugal e familiar dos casais do mesmo sexo que se joga o respeito colectivo por todas as pessoas, independentemente da orientação sexual, e pelas famílias com mães e pais LGBT, que já são hoje parte da diversidade da nossa sociedade; Porque sabemos que a igualdade no acesso ao casamento civil por casais do mesmo sexo não afectará nem a liberdade religiosa nem o acesso ao casamento civil por parte de casais de sexo diferente; Porque sabemos que a igualdade nada retira a ninguém, mas antes alarga os mesmos direitos a mais pessoas, acrescentando dignidade, respeito, reconhecimento e liberdade. Em 2009 celebra-se o 40º aniversário da revolta de Stonewall, data simbólica do início do movimento dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros. O movimento LGBT trouxe para as democracias - e como antes o haviam feito os movimentos das mulheres e dos/as negros/as - o imperativo da luta contra a discriminação e, especificamente, do reconhecimento da orientação sexual e da identidade de género como categorias segundo as quais ninguém pode ser privilegiado ou discriminado. Hoje esta luta é de toda a cidadania, de todos e todas nós, homens e mulheres que recusamos o preconceito e que desejamos reparar séculos de repressão, violência, sofrimento e dor. O reconhecimento da plena igualdade foi já assegurado em várias democracias, como os Países Baixos, a Bélgica, o Canadá, a Espanha, a África do Sul, a Noruega, a Suécia e em vários estados dos EUA. Entre nós, temos agora uma oportunidade para pôr fim a uma das últimas discriminações injustificadas inscritas na nossa lei. Cabe-nos garantir que Portugal se coloque na linha da frente da luta pelos direitos fundamentais e pela igualdade. O acesso ao casamento civil por parte de casais do mesmo sexo, em condições de plena igualdade com os casais de sexo diferente, não trará apenas justiça, igualdade e dignidade às vidas de mulheres e de homens LGBT. Dignificará também a nossa democracia e cada um e cada uma de nós enquanto cidadãos e cidadãs solidários/as – e será um passo fundamental na luta contra a discriminação e em direcção à igualdade.
Consideram ainda que

1) O que queremos e a nossa democracia necessita é de igualdade plena no acesso ao casamento civil - para casais do mesmo sexo e para casais de sexo diferente. Soluções alternativas, como a união civil registada ou semelhantes (o casamento “mas com outro nome”), constituem formas de secundarização dos casais do mesmo sexo e de todos os gays e todas as lésbicas. A cidadania de segunda é inadmissível, como o são instituições específicas para gays e lésbicas. Não se trata só de garantir direitos específicos iguais, trata-se de obter o pleno reconhecimento. A igualdade plena, que é também simbólica, só se garante com a mesma figura e com o mesmo nome. 2) A adopção por parte de casais do mesmo sexo é apenas uma parte da questão mais vasta da parentalidade (que inclui o reconhecimento das famílias já existentes, a reprodução medicamente assistida, entre outras) e é, portanto, um assunto que vai mais além da questão específica da igualdade de acesso ao casamento civil. A concentração na questão da adopção visa minar demagogicamente o debate sobre a igualdade, usando de forma manipuladora as crianças como armas de arremesso neste debate. Casamento não implica parentalidade e parentalidade não implica casamento – quer para heterossexuais, quer para homossexuais. 3) Tratando-se de uma questão de direitos civis, ela deve ser decidida pelo Parlamento e nunca através de um referendo. Os direitos de uma minoria, para mais historicamente perseguida e ainda hoje vítima de homofobia, não podem estar sujeitos a uma “ditadura da maioria”.

São já várias as individualidades que apoiam as pretensões do MPI: os escritores José Saramago, Ana Luísa Guimarães e Lídia Jorge, os artistas plásticos Graça Morais e Julião Sarmento, a jurista Teresa Beleza, o jornalista Miguel Sousa Tavares, o cientista Alexandre Quintanilha, os humoristas Herman José e Ricardo Araújo Pereira, os actores Alexandra Lencastre, Ana Zanatti, Catarina Furtado, Soraia Chaves, Filipe Duarte, Nuno Lopes e Pepê Rapazote, o psiquiatra Daniel Sampaio, a constitucionalista Isabel Mayer Moreira, o cavaleiro tauromáquico José João Zoio e Lili Caneças.

Tardou, mas chegou. Esperemos que, na próxima legislatura, esse assunto seja resolvido. Portugal merece. E os casais poderão andar menos apreensivos.

Fontes: Público e Há mas são verdes

26 maio 2009

Erika Martínez


Genealogía

El día que me atropellaron
mi madre, en la consulta,
sintió que le crujía
de pronto la cadera,
mi hermana la clavícula,
mi sobrina la tibia,
mi pobre prima la muñeca.
Les siguieron mis cuatro tías
y mis firmes abuelas,
con sus costillas y sus muelas,
con sus sorpresas respectivas.

Entre todas, aquel extraño día,
se repartieron
hueso por hueso
el esqueleto
que yo no me rompía.

Les quedo para siempre agradecida.


in Color carne, Pre-Textos, 2009

Oratória versus realidade

Portugal preza a excelência, o mérito e é um país tão fora de série que há mesmo quem já fale de revolução na educação. Os dislates são assim: muitos. O pior é que a visão de quem governa continua estreita, que a democracia permanece um exercício conflituoso (só há receptividade durante as campanhas eleitorais) quando não fictício.
O desporto é reconhecido pela lei, a cultura não.
O termo revolução ganha contextos cada vez mais vazios. Não acredita? Basta ver o que diz o ex-comunista Vital Moreira.

25 maio 2009

Pyrats

Mariana Aydar

Roma, Nápoles e Palermo


“Dá um aperto no coração andar por muitas cidades italianas como Roma, Nápoles ou Palermo e ver as paredes escritas e lixo nas estradas, parecem mais cidades africanas que europeias” - Silvio Berlusconi.
Silvio não gosta das cidades africanas? Conhecê-las-á? Estará a pensar nalguma cidade africana em particular ou será apenas um desabafo por alguma modelo lhe ter dito que gostava mais de modelos africanos do que primeiros-ministros senis?

Portugal é grande, o problema são os líderes


O problema de Portugal não está na produtividade da mão-de-obra mas na produtividade das gestões. Grande parte dos chefes e dos patrões tem umbigos muito desenvolvidos e cérebros muitos ocupados com o exibicionismo. E isso é que é, há séculos, o problema do nosso país.
A política dos baixos salários aliada à ambição do lucro fácil tem consequências nefastas. O país vai perdendo competitividade e isso vê-se pela perda de imigrantes. Os que vinham do Leste preferem a República Checa ou a Polónia, países onde há outra cultura, onde a educação é substancialmente melhor e que crescem mais do que este velho cantinho da Europa.
Por cá, ainda há abéculas que, em nome de dois ou três votos, defendem o encerramento de portas aos que vêm de fora, pois ainda não perceberam o quanto contribuem para o enriquecimento de Portugal.
No final de 2007, residiam em território nacional 420.189 imigrantes (cinco por cento da população do país, oito por cento da população activa, seis por cento do Produto Interno Bruto [PIB] e responsáveis por 9,7 por cento dos nascimentos). Os ilegais haverá apenas 55 a 75 mil.
Portugal só tem a ganhar com pequenos choques culturais. Sem imigrantes isso não é possível, agravando-se a cultura do chefe, o carreirismo, a espécie lambe-botas e outras pechas que contribuem para o nosso atraso.
Se continuamos a ser atractivos para quem vem do Brasil, da Ucrânia, de Angola, da Rússia e de Cabo Verde, recebamo-los sabendo que com eles vamos mais longe.

O telemóvel e as crianças


"O telemóvel é o meio que tenho para estar sempre a falar com os meus amigos. O MSN é a minha vida. Não consigo passar um dia sem entrar". "Sinto-me nu quando me esqueço do telemóvel em casa".
São crianças do segundo ciclo de ensino a falar, cujo dia-a-dia é marcado por essas duas ferramentas. E que ajudaram Teresa Sofia Castro na sua tese de mestrado em Tecnologias da Informação e Comunicação do Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho. A utilização do telemóvel e do messenger por crianças do 5.° e 6.° ano de duas escolas do distrito de Braga é recorrente, porque a aquisição do primeiro telemóvel coincide geralmente com a entrada para a escola, ou seja, quando as crianças iniciam o seu processo de maior emancipação, autonomia e socialização, fugindo ao controlo familiar.

Fonte: JN

24 maio 2009

Miguel d'Ors


Encontramos em Rayos y truenos, de Enrique García-Máiquez, um dos poemas do novo livro de Miguel d'Ors, que transcrevemos aqui com a devida vénia.

Cosas de la poesía

Qué suerte que Ella sea así de caprichosa,
qué suerte que no mire los méritos, que no
le avergüence entregarse a tipos como yo,
que sea porque sí, como la rosa;

qué suerte que no exija papeles triplicados,
ni saber alemán, ni traje gris,
que en Calahorra se encuentre tan bien como en París,
que no la embauquen nombres, premios ni doctorados.

Sólo que tú le gustes —con veinte o con setenta,
feo o guapo, listo o bobo...— y, plaf, se te presenta
deslumbrante, rendida y sin porqué,

del mismo modo que (según se cuenta)
una noche grisácea de los años 50
se presentó Ava Gardner ante Mario Cabré.


[Miguel d'Ors, Siete poemas de Sociedad Limitada, Vitolas del Anaïs, Granada, 2008]

As línguas mais faladas


O chinês é a língua número 1, com mil e 200 milhões de falantes. Segue-se o espanhol com 329 milhões e só depois vem o inglês com 328 milhões.
A seguir, temos: o árabe (221 milhões), o hindi (182 milhões), o bengali (181 milhões).
Na sétima posição está o nosso português com 168 milhões. Depois, o russo (144 milhões) e o japonês (122 milhões).
O alemão possui 90 milhões de falantes e o francês 68 milhões.
A contagem apenas considera quem fala as línguas ou vive no país que a tem como língua oficial. Assim, embora o inglês seja falado por muita gente, os números referem-se tão-só a quem vive em países que tem o inglês como língua oficial e aos que são naturais desses países.

23 maio 2009

Virgilio Piñera



Virgilio Piñera (1912-1979) nasceu e morreu cubano, pese embora os constrangimentos com que a Cuba de Fidel o brindou.
Em 2000, a Tusquets Editores (Barcelona) editava La Isla en Peso, antologia do poeta organizada por Antón Arrufat. Daí transcrevemos dois poemas. O primeiro, datado de 1967. O segundo, de 1962.
A imagem é copiada de um sítio dedicado ao poeta.

Testamento
Como he sido iconoclasta
me niego a que me hagan estatua;
si en la vida he sido carne,
en la muerte no quiero ser mármol.

Como yo soy de un lugar
de demonios y de ángeles,
en ángel y demonio muerto
seguiré por esas calles…

En tal eternidad veré
nuevos demonios y ángeles,
con ellos conversaré
en un lenguaje cifrado.

Y todos entenderán
el yo no lloro, mi hermano….
Así fui, así viví,
así soñé y pasé el trance.


«En la puerta de mi vecino...»

En la puerta de mi vecino
un papelito me dejó helado.
«No me molesten. Estoy llorando.
Y consolarme ya nadie puede.»

Ahora yo sueño com mi vecino.
Y mientras sueño, abro la puerta.
Adentro veo mi propia cara,
mi propia cara bañada en lágrimas.

22 maio 2009

Joaquín Sorolla y Bastida









Conhecido como o Pintor da Luz Joaquín Sorolla y Bastida (1863-1923) deixou obra vasta, com mais de duas mil pinturas. O Museu do Prado mostra, a partir de segunda-feira próxima, uma retrospectiva com mais de uma centena de quadros, a maior até agora realizada desse impressionista espanhol.

Há gente que não se enxerga

O senhor engenheiro fez fortuna. E sabe-se que enquanto patrão paga bem aos gestores mas pouco aos trabalhadores. A sua situação de privilegiado permite-lhe isso e muito mais, por exemplo arrotar postas de pescada podre como esta: "estar empregado deve satisfazer praticamente toda a gente neste momento", ou como esta: "não há emprego para quem quer estar a passar os fins-de-semana com os pés na água".
Já se sabe que estar com os pés na água é pecado. O trabalhador deve estar sempre pronto a obedecer à voz do chefe e jamais pôr os pés dentro de água. Isso é para os engenheiros e para os patrões.
O que ele talvez não saiba (ou gosta de fazer que não sabe) é que os sindicatos apareceram para juntar as forças diminutas de quem vive do seu salário, ampliando-as. E conseguindo, pela força da união, conquistar alguma qualidade de vida: horários de trabalho definidas; salários justos; pagamento de horas extraordinárias; direito à assistência na doença; etc. Tudo coisas que, pelos vistos, irritam o senhor Belmiro de Azevedo. Ele acha que quem tem emprego deve dar-se por feliz e estar muito bem caladinho. Ou seja, trabalhas sim mas eu pago-te o que me apetece, pois o que importa é o lucro que eu obtenho, o resto são tretas.
Em tempos de crise, palavras como as do senhor engenheiro soam a música. Qualquer "empregador" as usa em benefício pessoal, contra as leis, contra os direitos, contra a democracia.

21 maio 2009

Juan Manuel Roca


Poeta, crítico de arte e jornalista, Juan Manuel Roca é autor dos seguintes livros de poesia: Memoria del agua (1973); Luna de ciegos (1975); Los ladrones nocturnos (1977); Señal de cuervos (1979); Fabulario real (1980); Ciudadano de la noche (1989, 2001, 2003); Pavana con el diablo (1990); Prosa reunida (1993); La farmacia del ángel (1995); Tertulia de ausentes (1998); Teatro de sombras con César Vallejo (2002); Un violín para Chagall (2003 y 2004); Las hipótesis de Nadie (2005 y 2006); El ángel sitiado y otros poemas (2006); y Testamentos (2008).
Deixamos aqui alguns poemas do autor, que acaba de ver o seu livro Biblia de pobres contemplado com o IX Prémio Casa de América de Poesía Americana.

Días como agujas

Estoy tan solo, amor, que a mi cuarto
Sólo sube, peldaño tras peldaño,
La vieja escalera que traquea.


Canción del que fabrica los espejos

Fabrico espejos:
Al horror agrego más horror.
Más belleza a la belleza.
Llevo por la calle la luna de azogue:
El cielo se refleja en el espejo
Y los tejados bailan
Como un cuadro de Chagall.
Cuando el espejo entre en otra casa
Borrará los rostros conocidos,
Pues los espejos no narran su pasado,
No delatan antiguos moradores.
Algunos construyen cárceles,
Barrotes para jaulas.
Yo fabrico espejos:
Al horror agrego más horror,
Más belleza a la belleza.


El rock de los adioses

Con las guitarras de Wichi Nogueras
y Ramón Fernández Larrea


Y todos estos hombres que bailan
¿Van a morir? ¡Yeah!
Y los bárbaros que no llegan
Al poema del griego, ¿van a morir? ¡Oh, yeah!
Y el pájaro azul que me despierta
De la horrible pesadilla
En la que chapaleo ¿recubierto de lodo? ¡Yeah, yeah!
¿Y los niños, por Dios,
Los niños que vuelcan el cesto de sus voces
En medio de nuestra estúpida historia?
¡Sí, nena!
Y la luna rasurada y palmoteada con lavanda
Y la muchacha loca como los pájaros
Y los ríos donde la muerte se baña una y tres veces
Y las idiotas mañanitas de Dios
Y todos los poetas los engolados los puros
Los amorosos los solemnes y los piojosos
Todos los arrogantes y soberbios poetas
¿Van a morir? ¡Yeah! ¡Tres veces yeah!


Envuelto en la nada

Un cura me abofeteó en el patio del colegio porque no cantaba un himno, y mi mejilla, luego de 40 años, apenas regresa de aquella bofetada.

Vi en el giro de la mejilla hacia la izquierda el país que pudo ser, y en el giro a la derecha el encierro del sueño.

De regreso de la bofetada, ha empezado a holgar la casa como un sacón prestado. Sobra decir que sigo sin cantar el himno y la mano del cura al que nunca puse la otra mejilla está envuelta en la nada.

João Bénard da Costa (1935-2009)


Escritor, cinéfilo, católico, professor, actor ( nos filmes "O Convento", "Francisca", "Non, ou a vã glória de mandar" e "Amor de Perdição", de Manoel de Oliveira e em "Recordações da Casa Amarela", de João César Monteiro)Bénard da Costa foi sobretudo um leitor da alma humana.
Comecei a lê-lo no falecido O Independente, pelos finais da década de 1980, aprendendo entre “Os Meus Filmes da Vida” e “Os Filmes da Minha Vida” como o cinema é uma porta, uma janela, quando não um edifício inteiro contra o terror que a vida inspira.
Lê-lo era um prazer, ouvi-lo falar outro, não só pelo que dizia como também pela voz peculiar que tinha.
Sobre Bénard da Costa, vale a pena ler o que diz Alexandra Lucas Coelho aqui.

20 maio 2009

Along the river during the Cing-ming festival


O quadro (um dos grandes tesouros da China) foi pintado entre 1085 e 1145 e mede 5,28 m de comprimento por 24,8 cm de altura.
Clicando no detalhe aqui incluído é encaminhado para uma animação multimédia dessa pintura que faz parte do espólio do museu de Xangai. Pode percorrer o quadro para a esquerda ou para a direita, ao sabor do movimento do rato, e ver animações que mostram momentos da vida desse tempo.

A corda, o touro, os cromos

19 maio 2009

Carl Larsson (1853-1919)





Aguarelista sueco, particularmente conhecido pela colecção de 26 aguarelas de Ett Hem (Uma Casa), de 1899; pelas 32 aguarelas de Larssons (Os Larssons), de 1902, e pelas 31 de Åt solsidan (O Lado Ensolarado) – ilustrações da simples vida campestre e da sua família, que muita influência exerceram no design de interiores sueco.

O caso da professora de Espinho

vem mais uma vez lembrar a necessidade de haver um código deontológico dos professores.
Porque os professores são confrontados com muitos problemas dos alunos: afectivos; violência doméstica; pedofilia; toxicodependência; gravidezes; fome; agressões... E cada professor responde consoante o seu bom senso e conforme a sua maneira de ser, mas não deveria tudo isso estar contemplado num código que clarificasse onde começa e acaba a actividade docente?

As frases começam por "já agora"?

Qualquer zanga é grotesca se filmada e tornada pública. Tanto mais que quando elas deflagram dizem-se coisas impróprias. A professora de História da escola de Espinho, como facilmente se verifica pela gravação, está a reagir a quente a algo que lhe disseram. E talvez por excesso de proximidade com os alunos exagera os termos e deixa-se ir por atalhos pouco dignificantes.
Que as alunas tenham levado gravador para provocar a professora parece-me revelador de algo que cheira mal. Fazer o papel da vítima é relativamente fácil e se a coisa tiver sido amplificada como foi ainda se torna mais grotesco.
Obviamente, quando forem apurados os factos (por ora estamos no domínio das opiniões e do diz-se), a professora não contará com a mesma divulgação se tudo se vier a revelar uma tramóia.
Para já, constata-se a luta surda entre pais e professora, a exaltação desta e a atitude manhosa de alunas que levam gravador para a aula. Pena que apenas tenham sido publicitados os breves minutos em que a senhora puxa pelos seus galões de mestre e em que acusa uma aluna de ter rompido o hímen.
No meio há muito que está escondido e que certamente será apurado pelo inquérito a decorrer. Quanto à professora, culpada ou inocente, já foi julgada na praça pública e sendo pessoa emocionalmente instável deve estar à beira de um abismo. Conta para já com o apoio de outros alunos que a consideram "espectacular".

Fontes: 1, 2, 3, 4, 5


18 maio 2009

João Luís Barreto Guimarães


As Cadeiras

À aula de
quarta-feira assistiram 13 alunos e
27 cadeiras. Em resumo: a sala cheia.
Quando a
lição terminou os 13 alunos partiram e
acto contínuo contei 20 casais de cadeiras.
Às aulas que tenho dado nunca faltam
as cadeiras
ficam a ouvir-me atentas
(as costas muito direitas).
É bom de ver que as cadeiras entendem
tudo à primeira
parecem ser mais maduras (mais
pés
assentes na terra).

in A parte pelo todo, Quasi Edições, 2009

Porque não?


A escola vende pão, vende água, vende leite, vende comida. Porque não pode distribuir preservativos?
Os preservativos fazem mal à saúde dos adolescentes?
Os preservativos são a prova provada de que o diabo existe e como a escola é de deus, os preservativos não podem lá estar?
Os preservativos só se podem usar às escondidas e devem ser tabu. Pelo que deviam ser traficados como qualquer estupefaciente?
Os preservativos são um incentivo ao sexo fora do casamento, pois quem tem um preservativo tem logo uma erecção (daí que para disfunções erécteis os médicos prescrevam preservativos)?
Os preservativos são redondos e podem ser confundidos com:
a) uma chiclete?
b) uma hóstia?
c) um balão?
por isso e porque não são para brincar, pois o acto sexual é assunto sério e apenas para efeitos de procriação, jamais se podem distribuir preservativos.
Os preservativos deviam ser proibidos e quem os fabrica condenado à fogueira ou, então, a ser apedrejado até à morte?

Ou será que a pergunta deve ser apenas: quem tem medo dos preservativos? Porquê?

Depósitos ou estabelecimentos de ensino?


Certos pais, está visto, têm problemas por ter filhos. Portugal, pelos vistos, não os trata como gostariam de ser tratados. Ter filhos é uma opção de vida e tem custos. Às vezes os custos sobem e os pais ficam aflitos.
Mas é preciso perceber também que a realização de provas nacionais exige sossego. As escolas não são meros depósitos de crianças e adolescentes. Nem são creches.
Compete aos pais exigir que o Estado cumpra as leis, não que lhes facilite a vida em nome da comodidade. Se o Estado quer que as pessoas tenham filhos, deve proporcionar-lhes condições para que isso aconteça. Mas não pode nem deve agir em nome de interesses particulares.

Importa-se de repetir?


Nove horas? Onde? No Japão? Noutro lugar distante. Não, não pode ser. Deve ter havido engano, confundiram um 4 com um 9.
Parece que Maria José Araújo, do Centro de Investigação e Intervenção Educativas (CIIE) da Universidade do Porto, concluiu que uma criança pequena em idade escolar trabalha em média nove horas por dia. Onde é que foi buscar esse horário?
Reparem: a escola primária começa às 9h00. Às 10h30 param e têm 20 minutos de intervalo. E voltam a parar ao meio-dia, havendo hora a hora e meia de almoço. Seguem-se mais duas horas depois, com um intervalo pelo meio. Tudo junto, dará 4 horas de aula e chamar-lhe trabalho é um pouco forçado, pois as crianças passam grande parte do tempo distraídas e a brincar.
Os TPC não nenhum papão. São um modo de reforçar conhecimentos trabalhados na sala de aula. Que muitas crianças os rejeitem e executem mecanicamente é um sinal dos tempos. Tempos tão ambíguos que, fruto do excesso de tempo que os pais passam fora de casa, pretendem atirar para cima da escola aquilo que é obrigação de qualquer família: educar, incentivar, estimular, desenvolver.
Não é fácil, claro. Mas o que é que na vida é fácil? Os pais prefeririam trabalhar pouco e ganhar muito, mas já se vão dando por satisfeitos quando têm emprego, mesmo que sejam explorados.
O esforço é uma chatice, pois é. Mas é essencial para apetrechar os mais novos com habilidades (podem chamar-lhe competências) que doutro modo não adquirem. Porque não é a brincar que aprendem, é aprendendo.
A não ser que se pense que a escola deveria ser um simples jardim de infância, onde os alunos chegariam analfabetos e contentes ao final dos ciclos de ensino com um diploma de incapazes.
Pode haver professores que abusam dos TPC. Em qualquer profissão há abusos. Mas daí a pretender que os TPC são uma violência, é um pouco exagerado. E revela pouco conhecimento da realidade. São muitos os alunos que não os realizam. E são cada vez mais os que chegam ao fim do 9.º ano com grandes dificuldades em ler enunciados (instruções). O que poderá ser perigoso, pensem só nos tipos de trabalho que pedem essa competência que se supõe básica.
Há tanto para fazer nas escolas. Não são os magalhães nem disparates como este que vão resolver nada. Além de que insistir neste tipo de coisas agrava o estado de coisas e faz com que haja cada vez mais pais a demitirem-se de tudo o que diga respeito à educação dos seus filhos.

17 maio 2009

Louis Sclavis - Tango

O problema dos testículos


Napoleão parece que os tinha minúsculos e foi o que se sabe. Hitler também tinha vários problemas. Agora é a vez de destaparem os do generalíssimo Franco que, segundo a neta do ditador espanhol, Ana Puigvert, apenas possuía um testículo.
Esta relação dos testículos com o poder não é assunto novo. Já os clássicos tinham reflectido sobre essas questões e, no século XVIII e XIX, foram vários os que abordaram as relações de poder com problemas de cama.
Mas não deixa de ser curioso verificar a relação entre os testículos e a ditadura.
E a perda do emprego, afecta as relações sexuais? Nalguns casos, parece que as melhora. Noutros é como se fosse a chave da impotência e da total perda de desejo.

Deve ser da tradição


Há no nosso país muitos adeptos das tradições. Tanto que aparecem museus para tudo e mais alguma coisa, além, claro, daquele gosto pelo que é velho (excluindo seres humanos, pois esses ninguém gosta deles). Acresce a tendência para defender comportamentos em nome... das tradições.
Um verdadeiro culto, portanto.
Além dessas, outras tradições há muito arreigadas na maneira de ser dos portugueses: o culto pelo cargo.
Vejamos o caso dos professores. Alguns, por uma manifesta incapacidade para leccionar tudo fazem para se infiltrarem nas diversas estruturas burocráticas do ministério da educação. (ME) Uma vez aí instalados sentem-se superiores aos colegas e agem em conformidade.
A psicologia estuda estas fugas e encenações. E explica estes comportamentos. Mas nem por isso eles deixam de se repetir.
Vejamos o caso das instruções que o ME envia todos os anos para os professores lerem nas escolas. Chamam-lhe Manual do Aplicador e contém ordens muito claras: "Não procure decorar as instruções ou interpretá-las, mas antes lê-las exactamente como lhe são apresentadas ao longo deste manual".
E as instruções continuam: "Em primeiro lugar, chamo a atenção para o facto de não poderem falar com os vossos colegas" ou "Acabou o tempo. Não podem escrever mais nada. Agora vão ter o intervalo".
Aquilo é um manancial de rigor e de clareza. E tem que ser assim, pois não só os professores são pessoas muito distraídas, como podem sentar-se eles próprios a fazer as provas, o que não é permitido. Por isso, torna-se necessário especificar muito bem o que os professores devem fazer. Exemplos:
"Leia em voz alta: Agora vou distribuir as provas. Deixem as provas com as capas para baixo; Podem voltar as provas. Escrevam o vosso nome no espaço destinado ao nome; Querem perguntar alguma coisa?"
"Desloque-se pela sala, com frequência", "Rubrique o enunciado no local reservado para o efeito".
"Leia em voz alta: Ainda têm 15 minutos; Acabou o tempo. Estejam à porta da sala às 11h e 20 minutos em ponto. Podem sair".
"Leia em voz alta o seguinte: Agora vão iniciar a segunda parte da prova. Podem começar. Bom trabalho!"
"Recolha as provas e os rascunhos". "Mande sair os alunos, lendo em voz alta: Podem sair. Obrigado pela vossa colaboração!"
Podia ser anedota, mas não é. É Portugal no seu melhor. É o dirigismo do ME. Porque será que tomam os professores por imbecis? Tratar-se-á de uma projecção?
Sentados nos seus gabinetes, usufruindo dos ares frescos e condicionados, os burocratas todos os dias saem para a rua satisfeitos pelo dever cumprido. Eles tudo fazem para que Portugal seja um paraíso, o pior é a democracia que estraga sempre tudo. Há pessoas que nasceram para mandar e outras para obedecer, não é? Não é?... Raios, que ninguém responde. Maldito país. (Há quem diga que a isto se chama paranóia.)

16 maio 2009

Wendy Cope

Poem composed in Santa Barbara

The poets talk. They talk a lot.
They talk of T. S. Eliot.
One is anti. One is pro.
How hard they think! How much they know!
They're happy. A cicada sings.
We women talk of other things.

in Serious Concerns, faber and faber, 2002 (1.ª edição de 1992)


A nursery rhyme

as if it might have been written by T.S. Eliot

Because time will not run backwards
Because time
Because time will not run
............................................Hickory dickory

In the last minute of the first hour
I saw the mouse ascend the ancient timepiece,
Claws whispering like wind in dry hyacinths.

One o'clock,
The street lamp said,
'Remark the mouse that races toward the carpet.'

And the unstilled wheel still turning
.................................................Hickory dickory
.................................................Hickory dickory
dock

in Making Cocoa for Kingsley Amis, faber and faber, 1997 (1.ª edição de 1986)

João Almeida

O meu pai

bebo muito vinho
bebo muita aguardente
ressono
só sei berrar
não me lavo
sou porco
não tenho amigos
não sei dar educação aos meus filhos
sou tudo um pouco graças a deus

in Glória e Eternidade, Teatro de Vila Real, 2009

José Mário Silva


literatura

Esperávamos por
ela na esplanada,
sábados à tarde,
como quem espera
aquele amigo mais velho,
tão ingrato, que um dia
deixou de nos falar.

in Luz indecisa, Oceanos, 2009

Bright Star, filme de Jane Campion


A história de amor entre o poeta britânico John Keats (Londres, 1795 - Roma, 1821) e a sua encantadora vizinha Fanny Brawne, vista pelo olhar de Jane Campion (Wellington, Nova Zelândia, 1954). Um filme cheio de sussurros, borboletas e versos.

Bright star, would I were stedfast é parte do primeiro verso de um poema redigido em 1819 (imagem acima) por Keats. Que reza assim:

Bright star, would I were stedfast as thou art -
Not in lone splendour hung aloft the night
And watching, with eternal lids apart,
Like nature's patient, sleepless Eremite,
The moving waters at their priestlike task
Of pure ablution round earth's human shores,
Or gazing on the new soft-fallen mask
Of snow upon the mountains and the moors -
No - yet still stedfast, still unchangeable,
Pillowed upon my fair love's ripening breast,
To feel for ever its soft fall and swell,
Awake for ever in a sweet unrest,
Still, still to hear her tender-taken breath,
And so live ever - or else swoon to death.




15 maio 2009

A quem interessar


Copiamos deste blogue, com a devida vénia, a seguinte informação. E deixamos os comentários para quem de direito.

Como um livro aberto


A expressão a tua cara é como um livro aberto não podia ter encontrado melhor situação: ataque de phishing atinge utilizadores do Facebook.

Campanhas


O azeite já foi o demónio da alimentação. O mesmo aconteceu com o vinho. Depois veio o tabaco e desde há tempos que se nota a propensão para a ditadura alimentar.
A indústria do entretenimento fornece material em quantidade suficiente para ocupar o corpo e o espírito, mas... a saúde queixa-se. É que, segundo se diz, a obesidade pode vir a tornar-se uma pandemia, por causa do excesso de horas de sedentarismo aliado ao consumo repetido de açúcares e gorduras.
Ninguém parece muito preocupado com o ritmo frenético em que vivem as classes médias e baixas. Aliado a baixos rendimentos e à necessidade de compensar tudo isso com pequenos prazeres de boca. Isto para não referirmos os anseios de possuir aquilo que aos seus olhos são sinais de riqueza e bem-estar.
As pessoas são o que são por causa da vida que levam. É muito bem pensante falar de exercício físico, mas para a maior parte o exercício que fazem é já muito (acordar, tomar banho, fazer camas, arrumar algumas coisas, ir para as diversas paragens, etc.). Quanto a alimentação: comida decente custa os olhos da cara (as empresas não fornecem comida aos seus funcionários e o subsídio de refeição que pagam é ridículo), mas claro que é politicamente correcto falar-se de alimentação saudável.
Tão saudável que cada vez mais ser gordo é sinal de pobreza e ser elegante é sinal de riqueza. O século vinte conseguiu inverter os papéis, sim, senhor.
Os EUA e o Reino Unido aparecem nas tabelas como os países onde há mais obesos, mesmo entre crianças e adolescentes. Portugal e Espanha já figuram em lugar honroso. Sinal de desenvolvimento? Ou apenas imitação de maneiras de viver decalcadas de séries e outro telelixo? (Não é preciso ver TV, basta conviver com quem a vê e consome revistas e sítios onde os assuntos, os ideais e maneiras de estar se assemelham.)
O mais importante, pensamos, é cuidar das ansiedades e anseios que afligem as crianças e adolescentes - os grupos com que se identificam; as imagens que constroem do que é in ou bué de fixe. Ora não temos visto ninguém preocupado com isso. Mais facilmente se diz que a culpa da obesidade é dos hamburgueres, das batatas fritas e de estar muito tempo em frente da TV.
Ainda vamos assistir ao aparecimento de leis que proíbem a compra de X quantidade de carne, açúcar e mais. Os ships, os cartões e o avanço tecnológico tornarão esse controlo muito simples.

O homem perfeito ou o super-homem


1) Não come nada que não seja saudável
2) Bebe água e bebidas energéticas
3) Pratica exercício militantemente
4) É rico ou pertence à classe A
5) Não vê televisão
6) É viciado em telemóvel e internet
7) Não fuma
8) É amigo dos animais, mas, no geral, despreza os homens (talvez por pensar que o homem não é da espécie mineral)
9) Viaja muito
10) Não acredita na política, serve-se da política
11) Não envelhece (usa produtos adequados e recorre à cirurgia estética)

14 maio 2009

Portugal, meu amor II

Transcrevemos os últimos versos de um poema de Jorge Sousa Braga, em jeito de comentário ao post anterior.

Portugal
Vou contar-te uma coisa que nunca contei a ninguém
Sabes
Estou loucamente apaixonado por ti
Pergunto a mim mesmo
Como me pude apaixonar por um velho decrépito e idiota como tu
mas que tem o coração doce ainda mais doce que os pastéis de Tentugal
e o corpo cheio de pontos negros para poder espremer à minha vontade
Portugal estás a ouvir-me?
Eu nasci em mil novecentos e cinquenta e sete Salazar estava no poder nada
de ressentimentos
um dia bebi vinagre nada de ressentimentos
Portugal
Sabes de que cor são os meus olhos?
São castanhos como os da minha mãe
Portugal
gostava de te beijar muito apaixonadamente
na boca

Portugal, meu amor

9 X 30 = Portugal, meu amor. São nove documentários de 30 minutos cada, com realização de Luís Garcia e argumento de Hugo Gonçalves, um jornalista nascido em 1976 que viveu e trabalhou em Nova Iorque e em Madrid e que pretendeu ver o que mudou nestes 30 e poucos anos de democracia.
A Hugo Gonçalves inquietam-no coisas tão paradigmáticas como: Por que é que não há uma estrela porno em Portugal, já que quase todos os países ocidentais têm uma?
O primeiro documentário olha para as celebridades. E percorre em voo aéreo a indústria por trás dos eventos, o quem é quem e que dita o que é ou não uma socialite - "alguém sem profissão definida", como diz a directora da revista VIP.
Segue-se o futebol. Através das vozes de um talento dos juniores do Benfica, do histórico Nené, de um jornalista do jornal A Bola e do radialista e ídolo de infância Fernando Correia, tenta perceber a força de um desporto que antes era jogado por homens de bigode e que hoje reluz em torno de Figo e Ronaldo.
Depois vêm as auto-estradas dos fundos da União Europeia e a exclusão na Cova da Moura. O resto não fazemos ideia. Sabemos apenas que tudo vai para o ar na SIC Radical.
Parece que Hugo Gonçalves notou alguma "inquietude" nos portugueses com 35 anos de democracia, embora haja dependência do mediatismo e obsessão geral pelos símbolos de status vegetativo - os plasmas, os carros, o sofá com comando na mão. A "nossa democracia engordou" e "não há um sentimento de comunidade" diz o autor dos programas.

Fonte: Público