As entrevistas dão muitas vezes nisto: à primeira vista aquilo que se diz parece mais relevante do que de facto é. Soa bem, embora não passe de um lugar comum, dizer que quem escreve mal pensa mal. Esperar-se-ia que o escritor desenvolvesse o raciocínio. Não sabemos se o fez ou não. Apenas podemos ler o que está na página do jornal. E o que está é francamente pobre.
O que vem a ser mau pensamento? Não pensar pela cabeça de Mário Cláudio? Pensar que se escreve melhor do que Mário Cláudio? Vender muito mais do que vende Mário Cláudio? Ser mais conhecido do que o Mário Cláudio? Escrever frases mais longas do que as do Mário Cláudio? Ou, pelo contrário, redigi-las breves e incisivas?
Mário Cláudio se disse o que era isso de pensar mal, disse-o demasiado depressa e Isabel Lucas não teve tempo nem pachorra para transcrever as ideias do escritor. Se não disse e Isabel Lucas não lhe perguntou, a emenda é pior do que o soneto. Em qualquer dos casos a entrevista é apenas parte de um negócio: vender livros. Seja o do Mário Cláudio ou o de outro qualquer. Que o escritor se ponha a perorar sobre o assunto numa entrevista só pode querer dizer que é vaidoso e que quer tapar o Sol com a peneira.
«Há coisas mais importantes em torno do português do que as ortográficas. Desde logo as de carácter sintáctico. A nossa língua está a ser abastardada. As questões sintácticas têm a ver com o raciocínio, são de carácter mental. As outras têm a ver com cartilha. Quem escreve mal pensa mal e o inverso também é verdadeiro. Escrever e pensar mal são a mesma coisa. E escrever mal não é escrever dança com 's'. É essa ganga do mau pensamento que associo hoje à escrita: gente que pensa mal e que escreve mal.»
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