Há coisas a que se chega com razoável atraso. Porque é preciso vencer o tédio. A mim acontece-me com Vasco Pulido Valente. Espécie de bonzo nacional que se diz social-democrata, do mesmo modo que Paulo Portas é democrata cristão. Há designações que de tão vazias servem para se usar como emblema e ficam bem com a pose.
Só agora li a entrevista de Pedro Lomba. Uma dessas entrevistas que dão bem a medida da vaidade de duas pessoas: entrevistado e entrevistador. As pessoas de direita têm tiques assim. Gostam de dar nas vistas. Cultivam mesmo um ar meio blasé, a imitar os gauches que dizem detestar, porque lhes dá sainete. (Ah, que chatice, hoje saem-me termos franceses e isso é tão démodé.)
Vasco Pulido Valente é homem de certos ressentimentos. E isso torna-o engraçado aos olhos de quem o lê. O veneno, a bílis, o ácido funcionam como uma espécie de voyeurismo, a gente espreita para ver a posição que o Autor vai assumir. As posições contra por exemplo Cavaco Silva são uma delícia. Vasco Pulido Valente não lhe perdoa o modo como Cavaco o ignorou, pondo a nu a sua vacuidade. E não perde, por isso, oportunidade de dizer que Cavaco Silva é o inimigo número 1 do país e o culpado pelo estado em que estamos.
As contradições são o seu forte. Quando a pose é mais de historiador, quer mostrar que há continuidades que explicam as "falhas", mas quando o ressentimento é mais forte, isso é esquecido e opta pelo maniqueísmo mais primário.
Cavaco Silva não tem pergaminhos. Vasco Pulido Valente tem. Ambos estudaram fora. Ambos têm um relacionamento de longa data com o pensamento (e as afectações) do mundo anglo-saxónico. Mas Cavaco dominou o país durante anos. Conseguiu aquilo que antes dele ninguém conseguira. Ou seja, sempre foi um protótipo do português. Vasco Pulido Valente é mais da linha queirosiana, um estrangeirado. Alguém que toma a sua própria vaidade como régua através da qual mede tudo. E que não chega aos calcanhares do escritor. A medida de Vasco Pulido Valente é mesquinha. Veja-se este pequeno naco de pensamento (de ressentimento). «O país transformou-se. Foi o Cavaco que, como lhe disse, pôs o carro a descer a encosta. Ele criou aos portugueses o sentido de entitlement, quando o Estado lhes dava qualquer coisa isso passava a ser um direito. Transformou Portugal. Eu tenho um artigo qualquer que se chama "Homus Cavaquensis". Isso não foi um erro, foi uma profecia que acabou por se verificar. Se foi esse o grande erro que eu fiz... Eu costumava fazer campanhas eleitorais com um amigo meu que era médico. Entrávamos no distrito de Leiria e ele dizia-me sempre, isto em 1980, "agora vai devagarinho que aqui o Hospital de Leiria só tem algodão e mercúrio cromo". Anos depois, há hospitais moderníssimos. O Cavaco subiu as expectativas dos portugueses absurdamente.»
Cavaco é o culpado por... ter criado nos portugueses a sensação de que tinham direito a ter hospitais. Não têm. Vasco Pulido Valente sabe isso muito bem. Ele tem médicos na família. Os portugueses não podem ter hospitais. Isso é um crime. E é por causa desse crime que estamos onde estamos.
Só agora li a entrevista de Pedro Lomba. Uma dessas entrevistas que dão bem a medida da vaidade de duas pessoas: entrevistado e entrevistador. As pessoas de direita têm tiques assim. Gostam de dar nas vistas. Cultivam mesmo um ar meio blasé, a imitar os gauches que dizem detestar, porque lhes dá sainete. (Ah, que chatice, hoje saem-me termos franceses e isso é tão démodé.)
Vasco Pulido Valente é homem de certos ressentimentos. E isso torna-o engraçado aos olhos de quem o lê. O veneno, a bílis, o ácido funcionam como uma espécie de voyeurismo, a gente espreita para ver a posição que o Autor vai assumir. As posições contra por exemplo Cavaco Silva são uma delícia. Vasco Pulido Valente não lhe perdoa o modo como Cavaco o ignorou, pondo a nu a sua vacuidade. E não perde, por isso, oportunidade de dizer que Cavaco Silva é o inimigo número 1 do país e o culpado pelo estado em que estamos.
As contradições são o seu forte. Quando a pose é mais de historiador, quer mostrar que há continuidades que explicam as "falhas", mas quando o ressentimento é mais forte, isso é esquecido e opta pelo maniqueísmo mais primário.
Cavaco Silva não tem pergaminhos. Vasco Pulido Valente tem. Ambos estudaram fora. Ambos têm um relacionamento de longa data com o pensamento (e as afectações) do mundo anglo-saxónico. Mas Cavaco dominou o país durante anos. Conseguiu aquilo que antes dele ninguém conseguira. Ou seja, sempre foi um protótipo do português. Vasco Pulido Valente é mais da linha queirosiana, um estrangeirado. Alguém que toma a sua própria vaidade como régua através da qual mede tudo. E que não chega aos calcanhares do escritor. A medida de Vasco Pulido Valente é mesquinha. Veja-se este pequeno naco de pensamento (de ressentimento). «O país transformou-se. Foi o Cavaco que, como lhe disse, pôs o carro a descer a encosta. Ele criou aos portugueses o sentido de entitlement, quando o Estado lhes dava qualquer coisa isso passava a ser um direito. Transformou Portugal. Eu tenho um artigo qualquer que se chama "Homus Cavaquensis". Isso não foi um erro, foi uma profecia que acabou por se verificar. Se foi esse o grande erro que eu fiz... Eu costumava fazer campanhas eleitorais com um amigo meu que era médico. Entrávamos no distrito de Leiria e ele dizia-me sempre, isto em 1980, "agora vai devagarinho que aqui o Hospital de Leiria só tem algodão e mercúrio cromo". Anos depois, há hospitais moderníssimos. O Cavaco subiu as expectativas dos portugueses absurdamente.»
Cavaco é o culpado por... ter criado nos portugueses a sensação de que tinham direito a ter hospitais. Não têm. Vasco Pulido Valente sabe isso muito bem. Ele tem médicos na família. Os portugueses não podem ter hospitais. Isso é um crime. E é por causa desse crime que estamos onde estamos.
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