Além de coleccionador de livros raros, Laureano Barros foi um genuíno leitor. Amigo de muitos escritores, como Eugénio de Andrade ou Luiz Pacheco, a sua biblioteca incluía numerosos manuscritos e dactiloscritos que lhe foram sendo oferecidos por estes e outros autores. "Ao Laureano, com uma amizade que chega ao ponto de lhe oferecer isto", escreve Eugénio num raríssimo exemplar do seu primeiro livro, Narciso, que publicou aos 16 anos, ainda com o seu verdadeiro nome de José Fontinhas, e que depressa veio a rejeitar.
O facto de Laureano Barros não se ter regido apenas por critérios de coleccionismo deu à sua biblioteca uma abrangência pouco vulgar. Quem colecciona primeiras edições de Fernão Mendes Pinto, de António Vieira ou de Luís António Verney não costuma ter também o mítico O Amor em Visita de Herberto Helder ou os primeiros livros de João Miguel Fernandes Jorge. Laureano Barros tinha tudo isto e ainda arranjou tempo e dinheiro para compor uma boa biblioteca de historiografia portuguesa, para lá de livros dedicados a vários outros temas que o interessavam, como, por exemplo, a botânica.
Um dos núcleos mais importantes da colecção de Laureano, era um exaustivo conjunto de edições portuguesas e estrangeiras dos cancioneiros medievais. Outro, o das principais revistas literárias portuguesas, desde as oitocentistas, como Ave Azul, passando pelas mais importantes publicações do primeiro modernismo - Orpheu, Centauro, Exílio, Portugal Futurista, Byzancio ou Athena -, até às que saíram já na segunda metade do século XX.
Havia, depois, primeiras edições dos poetas quinhentistas Diogo Bernardes e Frei Agostinho da Cruz, uma segunda edição das poesias de Sá de Miranda, a edição original dos Apólogos Dialogais de Francisco Manuel de Melo e a segunda da sua Carta de Guia de Casados, ou ainda as primeiras edições de diversas obras do pedagogo iluminista Luís António Verney, incluindo o Verdadeiro Método de Estudar.
Laureano Barros coleccionou sobretudo literatura portuguesa, mas a sua biblioteca incluía também autores brasileiros e algumas obras em línguas estrangeiras, entre as quais se destaca um raríssimo exemplar da primeira edição em volume de Madame Bovary, de Flaubert. Outra peça curiosa era um exemplar setecentista, em latim, do Index de livros proibidos pelo Vaticano.
A partir do início do século XIX, e no que respeita à poesia e ficção portuguesas, o mais simples seria assinalar o que falta, e não falta quase nada de significativo até ao final da década de 1950. Atendendo só aos autores mais relevantes, pode começar-se por Garrett, com primeiras edições dos poemas Camões ou D. Branca, que introduziram o romantismo em Portugal, ou as de Folhas Caídas e do drama O Alfageme de Santarém, a par de muitas outras obras menos conhecidas.
a raríssima primeira edição dos Sonetos de Antero de Quental, as duas primeiras edições de Claridades do Sul, de Gomes Leal, o invulgar Mysticae Nuptiae, que Guerra Junqueiro publicou aos 16 anos, ou ainda, para não alongar os exemplos, as primeiras edições de O Livro de Cesário Verde e do Só, de António Nobre. No caso da obra-prima de Nobre, Laureano Barros deu-se mesmo ao luxo de reunir as oito primeiras edições.
Na ficção oitocentista, imensas primeiras edições de Camilo e de Eça de Queirós, por exemplo de Os Maias. Mas podiam acrescentar-se muitos outros autores, entre os quais Júlio Dinis, de quem possuía, além dos livros de ficção e poesia, um raríssimo opúsculo intitulado Da Importância dos Estudos Meteorológicos para a Medicina, de que apenas se publicaram 100 exemplares.
Quanto a Fernando Pessoa e à geração de Orpheu, a coisa volta a poder resumir-se em três palavras: não faltava nada. Nem sequer a segunda edição de Mensagem, menos valiosa do que a primeira (que, claro, Laureano Barros também tinha), mas provavelmente mais rara. Tinha todas as edições que o poeta publicou em vida, dos volumes de poesia inglesa ao texto O Interregno. Defesa e Justificação da Ditadura Militar em Portugal. De Almada Negreiros, algumas das peças mais raras são as primeiras edições da Cena do Ódio e do Manifesto Anti-Dantas. Bastante difíceis de encontrar são também as edições originais de Confissão de Lúcio, Céu em Fogo e Dispersão, de Mário Sá-Carneiro. Alfredo Guisado não é um autor da mesma importância dos anteriores, mas, por isso mesmo, o facto de Laureano Barros ter conseguido reunir todos os nove livros que o poeta publicou mostra bem até que ponto era um coleccionador minucioso. Que dedicava particular atenção a Aquilino Ribeiro, Agustina Bessa-Luís, Miguel Torga, António Botto, Camilo Pessanha, Florbela Espanca, Raul Brandão, Wenceslau de Moraes, José Régio, Irene Lisboa, Ferreira de Castro, Vitorino Nemésio, Sophia, Jorge de Sena, Herberto Helder e por aí adiante. Do primeiro livro de Mário Cesariny, Corpo Visível, que muitos coleccionadores bem gostariam de ter, o matemático de Ponte da Barca dava-se ao luxo de ter dois exemplares.
E mais, muito mais, como pode verificar quem consultar o catálogo que Manuel Ferreira organizou, com a minúcia que se lhe conhece, para o leilão que decorreu na cidade do Porto há tempos.
Texto ligeiramente modificado por nós, a partir daqui (não está assinado, mas supomos que é da autoria de Luís Miguel Queirós).
O facto de Laureano Barros não se ter regido apenas por critérios de coleccionismo deu à sua biblioteca uma abrangência pouco vulgar. Quem colecciona primeiras edições de Fernão Mendes Pinto, de António Vieira ou de Luís António Verney não costuma ter também o mítico O Amor em Visita de Herberto Helder ou os primeiros livros de João Miguel Fernandes Jorge. Laureano Barros tinha tudo isto e ainda arranjou tempo e dinheiro para compor uma boa biblioteca de historiografia portuguesa, para lá de livros dedicados a vários outros temas que o interessavam, como, por exemplo, a botânica.
Um dos núcleos mais importantes da colecção de Laureano, era um exaustivo conjunto de edições portuguesas e estrangeiras dos cancioneiros medievais. Outro, o das principais revistas literárias portuguesas, desde as oitocentistas, como Ave Azul, passando pelas mais importantes publicações do primeiro modernismo - Orpheu, Centauro, Exílio, Portugal Futurista, Byzancio ou Athena -, até às que saíram já na segunda metade do século XX.
Havia, depois, primeiras edições dos poetas quinhentistas Diogo Bernardes e Frei Agostinho da Cruz, uma segunda edição das poesias de Sá de Miranda, a edição original dos Apólogos Dialogais de Francisco Manuel de Melo e a segunda da sua Carta de Guia de Casados, ou ainda as primeiras edições de diversas obras do pedagogo iluminista Luís António Verney, incluindo o Verdadeiro Método de Estudar.
Laureano Barros coleccionou sobretudo literatura portuguesa, mas a sua biblioteca incluía também autores brasileiros e algumas obras em línguas estrangeiras, entre as quais se destaca um raríssimo exemplar da primeira edição em volume de Madame Bovary, de Flaubert. Outra peça curiosa era um exemplar setecentista, em latim, do Index de livros proibidos pelo Vaticano.
A partir do início do século XIX, e no que respeita à poesia e ficção portuguesas, o mais simples seria assinalar o que falta, e não falta quase nada de significativo até ao final da década de 1950. Atendendo só aos autores mais relevantes, pode começar-se por Garrett, com primeiras edições dos poemas Camões ou D. Branca, que introduziram o romantismo em Portugal, ou as de Folhas Caídas e do drama O Alfageme de Santarém, a par de muitas outras obras menos conhecidas.
a raríssima primeira edição dos Sonetos de Antero de Quental, as duas primeiras edições de Claridades do Sul, de Gomes Leal, o invulgar Mysticae Nuptiae, que Guerra Junqueiro publicou aos 16 anos, ou ainda, para não alongar os exemplos, as primeiras edições de O Livro de Cesário Verde e do Só, de António Nobre. No caso da obra-prima de Nobre, Laureano Barros deu-se mesmo ao luxo de reunir as oito primeiras edições.
Na ficção oitocentista, imensas primeiras edições de Camilo e de Eça de Queirós, por exemplo de Os Maias. Mas podiam acrescentar-se muitos outros autores, entre os quais Júlio Dinis, de quem possuía, além dos livros de ficção e poesia, um raríssimo opúsculo intitulado Da Importância dos Estudos Meteorológicos para a Medicina, de que apenas se publicaram 100 exemplares.
Quanto a Fernando Pessoa e à geração de Orpheu, a coisa volta a poder resumir-se em três palavras: não faltava nada. Nem sequer a segunda edição de Mensagem, menos valiosa do que a primeira (que, claro, Laureano Barros também tinha), mas provavelmente mais rara. Tinha todas as edições que o poeta publicou em vida, dos volumes de poesia inglesa ao texto O Interregno. Defesa e Justificação da Ditadura Militar em Portugal. De Almada Negreiros, algumas das peças mais raras são as primeiras edições da Cena do Ódio e do Manifesto Anti-Dantas. Bastante difíceis de encontrar são também as edições originais de Confissão de Lúcio, Céu em Fogo e Dispersão, de Mário Sá-Carneiro. Alfredo Guisado não é um autor da mesma importância dos anteriores, mas, por isso mesmo, o facto de Laureano Barros ter conseguido reunir todos os nove livros que o poeta publicou mostra bem até que ponto era um coleccionador minucioso. Que dedicava particular atenção a Aquilino Ribeiro, Agustina Bessa-Luís, Miguel Torga, António Botto, Camilo Pessanha, Florbela Espanca, Raul Brandão, Wenceslau de Moraes, José Régio, Irene Lisboa, Ferreira de Castro, Vitorino Nemésio, Sophia, Jorge de Sena, Herberto Helder e por aí adiante. Do primeiro livro de Mário Cesariny, Corpo Visível, que muitos coleccionadores bem gostariam de ter, o matemático de Ponte da Barca dava-se ao luxo de ter dois exemplares.
E mais, muito mais, como pode verificar quem consultar o catálogo que Manuel Ferreira organizou, com a minúcia que se lhe conhece, para o leilão que decorreu na cidade do Porto há tempos.
Texto ligeiramente modificado por nós, a partir daqui (não está assinado, mas supomos que é da autoria de Luís Miguel Queirós).
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