4
À noite é fácil falar do coração
do lago: o seu bater regular
sob a superfície qualquer o pode sentir,
se tocar no majestoso corpo.
E também da sua língua é possível falar,
os insistentes farrapos de frases que sobre ele
deslizam são compreensíveis.
Só tens que imaginar os olhos,
esses ficam invisíveis. Finalmente chegas
à margem, num ritmo lento e regular,
discretamente vais para terra.
5
Vou dizer o meu nome sobre
a água... Nada mais natural que repetir
esta ideia, mesmo que não haja eco.
Começas então a falar, palavra a palavra
o lago enche-se. Que pressa a tua!
Enxames de mosquitos fazem dançar o ar,
os peixes, como doidos, ultrapassam o limite,
tudo entra em movimento. Só tu o não
acompanhas, vais sossegando no desassossego, até que
as palavras te faltam. Passará muito tempo. A noite
traz-te o nome de volta. Não te reconheces.
[O Lago, versão e posfácio de João Barrento, apáginastantas, 1986]
Sem comentários:
Enviar um comentário