12 setembro 2009

Excertos de "O regresso de Jorge de Sena"

Diz Vasco Graça Moura «Jorge de Sena como poeta é "gigantesco e torrencial". "É evidente que a percepção do país a partir quer do exílio brasileiro, quer do exílio norte-americano contribuiu para um enorme coeficiente de amargura em relação à maneira como via Portugal. Voltou cá, em 1977, para fazer o discurso da Guarda, a que chamava 'o sermão da Guarda'. Foi com certeza uma grande satisfação para ele e, para nós, uma grande lição."
Nesse discurso, no Dia de Portugal, por onde passava Camões, Sena afirmou que "os portugueses são de um individualismo mórbido e infantil de meninos que nunca se libertaram do peso da mãezinha" e que a nossa história esteve "sempre repartida entre o anseio de uma liberdade que ultrapassa os limites da liberdade possível (ou sejam as liberdades dos outros, tão respeitáveis como a de cada um) e o desejo de ter-se um pai transcendente que nos livre de tomar decisões ou de assumir responsabilidades, seja ele um homem, um partido, ou D. Sebastião".»

Jorge Fazenda Lourenço salienta a articulação entre o carácter ético da poesia e a preocupação estética, num tempo em que estas duas vertentes estavam dissociadas.

«Depois do 25 de Abril de 1974, Sena regressou à pátria já em liberdade, mas ficou apenas dois meses. "O país na verdade nunca o reconheceu. E se no tempo da ditadura podíamos achar isso natural, já não o achávamos depois do 25 de Abril. Ele gostava de ter regressado", lamenta Mécia de Sena.
Na opinião de Fazenda Lourenço, essa ideia da incompreensão existe mais do ponto de vista do cidadão, porque como poeta sempre foi reconhecido. "Embora sempre restritamente, mas isso é o que acontece com todos os escritores portugueses." O facto de Sena não ter sido muito acarinhado depois do 25 de Abril está, na sua opinião, relacionado com a sua independência política. "As pessoas nas universidades portuguesas nunca acharam muito bem que Jorge de Sena viesse. Às vezes pelas razões mais estúpidas!" Lembra que o poeta Joaquim Manuel Magalhães foi testemunha de uma assembleia na Faculdade de Letras onde chegou a argumentar-se que ele não merecia regressar porque já não era português e porque nunca tinha sido antifascista. "Ele sempre foi inconveniente numa altura em que as pessoas não reconheciam esse tipo de autonomia crítica. Era uma altura em que se pensava pôr nos lugares as pessoas que poderiam de algum modo ser fiéis partidariamente."»

Fonte: Público (artigo de Isabel Coutinho).

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