28 fevereiro 2009

Lindo, tão lindo como um pôr do sol


Há postais de que as pessoas gostam. Há momentos que emocionam as pessoas. Há situações que comovem as pessoas.

Gostar, emocionar, comover: todo o meu ser (mais uma expressão linda linda) reage assim ao belo (lindo lindo) discurso do senhor professor Carlos Reis. Diz o sr. professor que a revalorização dos textos literários, enquanto "repositórios de uma cultura, de uma memória cultural e de um legado estético" e as alterações na linguagem introduzidas pelas tecnologias de informação e comunicação são dois aspectos tidos em conta nos novos programas.

Leitores, limpem as lágrimas. Carlos Reis é de um singeleza tão arrebatadora. Esta preocupação pelo literário e pelas novas tecnologias é absolutamente extraordinária. Quem haveria de se lembrar de algo assim tão lindo lindo salvo um génio como o sr. professor e a respectiva equipa?

Agora, para quantos deixaram de acreditar em Deus mas acreditam em Carlos Reis, o mundo da leccionação fluirá como nunca, pois as alterações metodológicas, didácticas, científicas, sociais e técnicas dos últimos anos que motivaram "reajustamentos" nos programas e, nalguns casos, "alterações substanciais" encarregar-se-ão de mostrar como a língua materna é moderna, gira, bué de fixe.

Não bastava a incapacidade cada vez maior de perceber o que se lê (logo que se saia da disparatada listagem de obras literárias do plano nacional de leitura), fruto das modernices pedagógicas ("metodológicas, didácticas, científicas, sociais e técnicas")... Não, era urgente gastar uns quantos euros com uma equipa que criou e vai distribuir os pozinhos de perlimpimpim... E assim tudo será mágico.

A maior parte dos manuais do ensino básico são elaborados por gente que gosta muito de esquemas, de imagens giríssimas, de perguntas bacocas. Ou seja, gente com a velha escola salazarista de tudo dirigir. Gente que, vê-se logo, nada lê, mas cuja preocupação é como a do senhor professor doutor Carlos Reis - serem modernos, actuais, lindos lindos.

Se julgam que fazemos bluff, folheiem esses manuais. Seja qual for a editora e a equipa redactorial e vejam se não é como dizemos.

Há uns anos houve uma editora, a Raiz, cuja percepção de manual era bem distinta da mediocridade instalada, mas não deve ter tido clientes à altura. Eu, por exemplo, sei de um senhor que é actualmente presidente de um conselho executivo e que se queixava muito da falta de perguntas.

O país, em vez de gastar os tais euros a formar professores como devia, gasta-os em show off, na certeza de que cada equipa que passa pelo Ministério da Educação pode fazer a porcaria que quiser que a culpa será sempre endossada aos que obedecem.

O novo programa é um amontoado de TLEBS que só virá complicar a vida dos alunos - porque as TLEBS enfermam do tique estruturalista que sempre se esquece que só a partir de determinadas idades os alunos são capazes de reflectir sobre a língua. Antes têm que ultrapassar os vícios apreendidos no meio onde vivem e onde se movem. Mas isso que importa, se falar de tecnologias é tão bem e tão in?

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