29 setembro 2009

Do lucro e dos apêndices


A lógica do lucro é poderosa. E é-o de tal maneira que são raros os que lhe escapam. No entanto, para que esse poder seja exercido com eficácia, o lucro tem um imenso guarda-fatos e usa um imenso número de máscaras. O emprego ou a criação de emprego é um desses artifícios. Não há discurso público ou privado que não se sirva do argumento da criação de emprego para melhor alcançar o objectivo fundamental: a obtenção de lucro.
Diz-se que sem trabalho não há lucro. Dizer demasiado antigo e pouco eficaz nos tempos que correm. Obtém-se mais lucro com especulação do que com trabalho. Mas nem todas as empresas estão vocacionadas para a especulação. As regras de mercado e natureza social e estatutária das empresas, além das limitações dos empresários, impedem-nas de se movimentarem no meio da especulação e constrangem-nas a outras formas de obtenção do lucro.
O princípio mais clássico é o da exploração de mão-de-obra, havendo também a calotice (não pagar a fornecedores).
Parece que os empresários portugueses são excelentes. Há anos que ouvimos falar da baixa produtividade e de outras coisas assim, deixando sempre de fora o empresário e pondo sempre a tónica no trabalhador. É um pensamento mais fácil e socialmente muito mais bem remunerado. Pois se as pessoas começassem a duvidar das qualidades empresariais dos empresários punha-se em risco toda a lógica do sistema.
Não é que de quando em quando não venham a lume notícias reveladoras da dita "qualidade" empresarial. Por exemplo, a de que são muitos os que se servem da crise para porem em prática o seu apurado sentido predador: destruindo empresas e empurrando para o desemprego os que nelas laboravam.
Este ano já foram feitas 70 participações criminais referentes a actividades irregulares de empresas, 45 das quais por encerramento ilegal no âmbito da crise. Além dos 523 autos por infracções detectadas em incumprimento de formalidades nos despedimentos colectivos ou outras situações de lay-off.
A excelência empresarial exige, para continuar no bom caminho, que o Estado regule pouco e, sobretudo, que inspeccione ainda menos. Mas, pelos vistos, o Estado tem sido chamado a inspeccionar e a agir. Algo que deve incomodar os barões dos empresários, apesar de por ora parecerem mais preocupados com o Bloco de Esquerda e com possíveis alianças entre o BE e o PS. Pois se há coisa que incomoda os barões é sentirem-se postos de lado. E para estar nas bocas do mundo e para que o mundo perceba a excelência, o mérito, a nobreza e o requinte da classe empresarial portuguesa, nada como fazer barulho fora das coutadas, de preferência em terrenos baldios. Assim, podem continuar os seus afazeres, contribuindo para a riqueza do país (as suas próprias contas bancárias).

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