Há muita gente assim, sabem de um ofício, no qual quase sempre se especializaram por necessidade, a que juntam alguma esperteza e... o resto é sorte e atrevimento. Qualquer que seja o país, é assim. Muitos alfarrabistas e antiquários são dessa estirpe: self made man.
O caso reporta-se a uma mulher francesa, Simone Boulez, que tem estaminé no Mercado das Pulgas, em Paris. Há 11 anos recebeu a incumbência de limpar um apartamento no Quartier Latin. Entre os papéis encontrou uns que diziam Simone e Cioran. Como ela se chama Simone achou aquilo engraçado. Um sobrinho alertou-a para o segundo nome, parecia-lhe o de um escritor famoso. Pelo sim pelo não, resolveu guardar o achado. Teve sorte. Os papéis foram avaliados em meio milhão de euros. Mas ainda não viu tostão. E por causa deles já teve de desembolsar algum.
O achado: 18 cadernos da papelaria parisiense Joseph Gilbert. Neles se guarda uma espécie de diário do filósofo Emil Cioran, de 1972 a 1980. Ali estão cinco versões de uma das obras magnas de Cioran, Do inconveniente de ter nascido (nunca traduzida entre nós). Também há esboços de outros libros, frases, títulos postos de lado ("nostalgia do dilúvio"), pensamentos, aforismos, notas.
Simone Boulez nunca ligou patavina aos papéis, limitou-se a vender a máquina de escrever de Cioran no Mercado das Pulgas de Montreuil, sem receber um cêntimo a mais por ter pertencido a um filósofo conhecido. Afinal, que sabia ela?
Os anos passaram e os diários continuavam algures no armazém de farrapeira da Simone. Até que, em 2005, um leiloeiro de obras de arte que conhecia Simone Boulez disse-lhe que ia vender uns quantos cadernos de Céline. Ela retorquiu: "Pois eu tenho uns de Cioran".
O negócio não chegou a ir avante, por impedimento judicial. Poucas horas antes do leilão chegou o embargo. Os depositários legais de toda a obra inédita de Cioran, a quem a mulher de Cioran tinha deixado o espólio, reclamaram os cadernos. E explicaram que quando Simone Boué morreu, em 1997, dois anos depois de Cioran, reunira-se em sua casa um grupo de pessoas que a passou a pente fino, excepto o sótão. Nesse apartamento, situado no quinto piso do número 21 da Rue de L'Odéon, a um passo do teatro, numa rua que ainda conserva velhas livrarias de livros raros, recolheram uma cassette, uma televisão, e pouco mais. Meses despois, Boulez recebeu o encargo de limpar o apartamento. E foi ao sótão, ou seja, enfiou-se entre a porcaria e lá recolheu os papéis. Mas os herdeiros legais não quiseram saber. Querem é o material para eles próprios ganharem o seu. Sem terem sujado as mãos nem as suas roupinhas de marca. Boulez não gostou nem disso nem da forma como foi tratada e o caso foi parar aos tribunais. Ganhou o primeiro assalto, ao mostrar em tribunal um papel que a autorizava a desembaraçar-se de tudo o que estava no apartamento. Sem ela, os diários em litígio não existiriam.
Os anos passaram e os diários continuavam algures no armazém de farrapeira da Simone. Até que, em 2005, um leiloeiro de obras de arte que conhecia Simone Boulez disse-lhe que ia vender uns quantos cadernos de Céline. Ela retorquiu: "Pois eu tenho uns de Cioran".
O negócio não chegou a ir avante, por impedimento judicial. Poucas horas antes do leilão chegou o embargo. Os depositários legais de toda a obra inédita de Cioran, a quem a mulher de Cioran tinha deixado o espólio, reclamaram os cadernos. E explicaram que quando Simone Boué morreu, em 1997, dois anos depois de Cioran, reunira-se em sua casa um grupo de pessoas que a passou a pente fino, excepto o sótão. Nesse apartamento, situado no quinto piso do número 21 da Rue de L'Odéon, a um passo do teatro, numa rua que ainda conserva velhas livrarias de livros raros, recolheram uma cassette, uma televisão, e pouco mais. Meses despois, Boulez recebeu o encargo de limpar o apartamento. E foi ao sótão, ou seja, enfiou-se entre a porcaria e lá recolheu os papéis. Mas os herdeiros legais não quiseram saber. Querem é o material para eles próprios ganharem o seu. Sem terem sujado as mãos nem as suas roupinhas de marca. Boulez não gostou nem disso nem da forma como foi tratada e o caso foi parar aos tribunais. Ganhou o primeiro assalto, ao mostrar em tribunal um papel que a autorizava a desembaraçar-se de tudo o que estava no apartamento. Sem ela, os diários em litígio não existiriam.
A cena dos próximos capítulos há-de chegar. Por ora, os diários de Cioran estão nas mãos de uma farrapeira, o que não deixa de ter algo de sedutor.
Em português de Portugal há poucos livros traduzidos desse mestre do aforismo. Já no Brasil há mais. Portugal não conta para nada. Mas isso já todos sabemos. Que bom seria descobrir numa farrapeira do jardim uns cadernos de Cioran. Que charme.
Procurem na foz do Tejo. É lá que Cioran se banha.
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